12 junho 2017

As Lojas e a Grande Loja: conceção basista - e sua crítica


Em 24 de junho de 1717, quatro Lojas maçónicas londrinas reunidas na taberna Goose and Gridiron decidiram associar-se numa Grande Loja e eleger um Grão-Mestre que a todos os seus obreiros representasse. Foi assim que, em síntese, James Anderson registou o nascimento da primeira Grande Loja macónica, hoje normalmente designada por Premier Grand Lodge. Este é o facto que se convencionou constituir o nascimento da Maçonaria Especulativa.

Foram quatro Lojas que se associaram e decidiram constituir uma Grande Loja. Foram essas quatro Lojas e os seus respetivos obreiros que decidiram eleger um Grão-Mestre. São as Lojas que dão origem às Grandes Lojas. São os maçons que escolhem o Grão-Mestre. Esta inegável verificação constitui a base fundamentadora da conceção basista do relacionamento entre as Lojas e as respetivas estruturas agregadoras (Grandes Lojas ou Grandes Orientes).

Para esta conceção basista, a origem do poder está nas Lojas e nos respetivos obreiros, tanto assim que são as Lojas quem cria as Grandes Lojas e os obreiros quem elege o Grão-Mestre, diretamente ou por representação das respetivas Lojas, consoante os sistemas de eleição do Grão-Mestre em vigor em cada Obediência maçónica. Em consequência, a Grande Loja só exerce as competências que lhe são delegadas pelas Lojas e o Grão-Mestre exerce apenas o poder que lhe é delegado pelos seus eleitores. O essencial da Maçonaria está nas Lojas. As Grandes Lojas são meras estruturas administrativas e de coordenação. Mas a prevalência está nas Lojas. Estas é que mandam na Grande Loja. Não o inverso.

Sendo histórica e iniciaticamente correto afirmar-se que são as Lojas que originam a Grande Loja e não o inverso, sendo inquestionável que a legitimidade dos Grão-Mestres assenta na sua eleição pelos Mestres de toda a Obediência, no entanto a adoção pura e dura desta conceção basista da subordinação das Grandes Lojas às Lojas não é razoável e conduz a resultados perversos. Como em tudo na vida, a absolutização desta conceção é perniciosa e - goste-se ou não - não espelha a realidade. Não se trata de conflito entre o que deve ser e o que é. Trata-se do respeito da natureza, do lugar e das tarefas que devem ser assumidas por uma e outra estruturas. 

Absolutizar a conceção basistas do relacionamento entre as Lojas e a Grande Loja conduz, por exemplo, à aceitação, quiçá promoção, da existência de Lojas selvagens. Se a legitimidade reside absolutamente na Loja, então esta pode, a todo o tempo, decidir desligar-se da Grande Loja e atuar por si só, em absoluta independência. No entanto, sabemos que - particularmente na Maçonaria regular - tal não é, hoje em dia, considerado aceitável.

Ao constituir uma Grande Loja, ao integrar uma Grande Loja ou ao criar-se no âmbito de uma Grande Loja, a Loja maçónica procede à tal delegação de competências suas na Grande Loja, mas simultaneamente renuncia ao direito de retirar as competências delegadas. As competências essenciais de regulação, de coordenação, de representação, de ordenação, que as Lojas delegam na respetiva Grande Loja ou no respetivo Grande Oriente, uma vez atribuídas não são retiráveis. 

Com a constituição de uma Grande Loja fez-se nascer uma nova entidade. Entidade detentora de direitos, obrigações, atribuições e competências que, uma vez originariamente nela objeto de delegação, quem assim delegou não tem já o direito de retirar.

Pelo facto de a Loja constituir, aderir ou criar-se no âmbito de uma Grande Loja, automaticamente renunciou à absolutização do seu poder, pois decidiu partilhá-lo com a estrutura que criou, a que aderiu ou em cujo âmbito se criou.

Assim, reconhecendo-se a natureza originária do poder residindo nas Lojas, não é, porém, correta a conceção basista do relacionamento entre as Lojas e a respetiva Grande Loja ou o respetivo Grande Oriente. A natureza da criação, existência e relacionamento de ambas as estruturas irrecusavelmente fez nascer uma mútua obrigação inderrogável de partilha de atribuições e competências. 

Na definição, fixação e medida dessa partilha é obviamente importante o reconhecimento de que a origem está na Loja, que a legitimidade assenta na escolha dos obreiros. Mas tal reconhecimento não admite a absolutização ou, sequer, uma insensata prevalência de um basismo, que seria inconsequente, inoportuno e, afinal, contrário aos interesses das Lojas e dos respetivos obreiros.

A pura e dura conceção basista do relacionamento das Lojas e da Grande Loja não é, assim, o entendimento acertado. No próximo texto, procurarei expor - e igualmente criticar - a conceção inversa.

Rui Bandeira 

05 junho 2017

O Venerável Mestre, o Grão-Mestre e os obreiros da Loja


O meu último texto, que intitulei A aventalite, mereceu vários comentários, quer neste blogue, quem numa rede social onde o mesmo foi publicado. Um dos comentadores fez uma afirmação que merece nela nos detenhamos. Rezava esse comentário, na parte que aqui interessa:

"(O Venerável Mestre) como todos sabemos e conhecemos pelo Regulamento Geral, é o único representante em Loja do Muito Respeitável Grão-Mestre."

Factualmente, e no que respeita à GLLP/GLRP, este comentador tem toda a razão no que afirma. O art. 64.º, n.º 3, do Regulamento Geral da GLLP/GLRP dispõe expressamente:

"O Venerável Mestre em Loja representa o Grão-Mestre."

Norma vigente é norma para ser respeitada - e ponto final! Mas tal não implica que não se possa - em bom rigor, mesmo, não se deva! - analisar a pertinência de uma norma, na perspetiva do aperfeiçoamento futuro da regulamentação. 

Do meu ponto de vista, esta norma vigora e, enquanto vigorar deve ser respeitada, mas será conveniente que, com calma e na altura própria, se analise se a mesma deve manter-se, no seu preciso teor.

É que, sendo norma em vigor (na GLLP/GLRP) que, em Loja, o Venerável Mestre representa o Muito Respeitável Grão-Mestre, uma serena análise permite-nos concluir que, na natureza da Maçonaria, não é isso que sucede, ou deve suceder. Eu diria até que... pelo contrário! Quem representa o titular de uma função? Naturalmente, que representa quem o designa ou escolhe para essa função!

Ora, o Venerável Mestre de uma Loja maçónica - excetuadas as situações, atípicas, de designação pelo Grão-Mestre até à realização, em prazo que não deverá exceder 180 dias, de eleição para o ofício, designadamente quando uma Loja levanta colunas e está em início de trabalhos ou quando atravessa uma crise que impõe a intervenção administrativa da Grande Loja - é eleito pelos obreiros da Loja! Portanto, em bom rigor, o Venerável Mestre só quando é designado, transitoriamente, pelo Grão-Mestre é que o representa. Só nestas particulares e excecionais circunstâncias, em que, seja no início da atividade da Loja, seja em face de circunstâncias anormais, o Grão-Mestre necessita de transitoriamente intervir na Loja e designar um seu responsável até à normalização da escolha por via de eleição pelos obreiros da mesma, é que se pode dizer que é natureza das coisas que o Venerável Mestre designado representa o Grão-Mestre.

E representa-o então, por natureza, apenas e tão só porque não dispõe de legitimidade conferida pelos seus pares e, portanto, necessita de exercer o seu múnus (transitório, repete-se) beneficiando da legitimidade do Grão-Mestre.

Mas, em situação normal, o Venerável Mestre em funções exerce as mesmas porque foi eleito pelos obreiros da sua Loja para assegurar esse exercício. Exerce, portanto, o seu ofício, em representação dos obreiros da sua Loja, que o elegeram para tal. Em exercício normal de funções, o Venerável Mestre da Loja não tem a sua legitimidade por designação do Grão-Mestre, obtém-na por manifestação da vontade coletiva dos obreiros da sua Loja. E, portanto, é a estes que representa.

Uma afirmação descritiva da Maçonaria de que gosto muito, e que frequentemente utilizo, é a que reza que Maçonaria é um maçom livre numa Loja livre. É uma conceção da Maçonaria que preza e afirma o essencial da Maçonaria e da trilogia que tantas vezes, e orgulhosamente, proclamamos: Liberdade - Igualdade - Fraternidade.

O maçom livre junta-se a outros maçons, também livres e, em conjunto, formam uma Loja livre. Livremente a formam e nela atuam. As limitações à liberdade de cada um são por eles fixadas e assumidas e aceites, em ordem à serena e cabal organização, decisão e atuação coletiva. No seio da Loja que todos livremente formaram ou a que livremente aderiram, todos têm um estatuto de perfeita Igualdade. E a sua atuação pauta-se pela indispensável Fraternidade. Quando isto está reunido, faz-se Maçonaria. E a lideraqnça que em cada momento é exercida resulta da Liberdade de todos, da Igualdade de todos, da escolha efetuada por todos em perfeita Fraternidade. O líder, o Venerável Mestre, no exercício normal de funções recebe a sua legitimidade de quem o elegeu e a quem, assim, representa.

Portanto, em bom rigor, a natureza das coisas é que, apesar de estar escrito em regulamento que em Loja o Venerável Mestre representa o Grão-Mestre, na realidade o Venerável Mestre representa os obreiros da sua Loja, designadamente perante o Grão-Mestre.

Porque existe então a mencionada norma regulamentar? Porque, tal como os maçons sabem que não são perfeitos e necessitam continuamente de se aperfeiçoar, também as suas obras, e escolhas, necessitam de constante aperfeiçoamento. Esta norma em concreto é um resquício de uma dada conceção de Grande Loja, que não é a única e que compete com outra conceção de Grande Loja. O regulamento da GLLP/GLRP, tal como - não tenhamos dúvidas! - os regulamentos de outras Obediências maçónicas, é o resultado de compromisso, balanço, evolução, equilíbrio entre duas conceções de Grande Loja ou Grande Oriente, uma mais centralizadora que outra.

Mas isso será tema para esmiuçar em mais um par de textos que hão de vir!

Rui Bandeira  

29 maio 2017

O Painel de Aprendiz

Tal como está no nosso ritual na página 15, vamos aborda-lo de baixo para cima e da esquerda para a direita
1.    Piso branco e preto
O pavimento, alternadamente em preto e branco, simboliza, os Princípios de Bem e do Mal, simboliza a guerra entre Miguel e Satanás, dos Deuses e Titãs, entre a luz e a sombra, dia e noite, da Liberdade e Despotismo;
O que é bom para mim pode ser mau para ti.
Neste Grau de Aprendiz, o pavimento mosaico representa o piso térreo do Templo do Rei Salomão.

2.   As Colunas, os 3 degraus e as Romãs
O local de reunião de uma Loja maçónica tem por entrada um espaço delimitado por duas colunas. Estas evocam as duas colunas que existiam no átrio do Templo de Salomão, descritas na Bíblia no 1.º Livro dos Reis, capítulo 7, versículos 15-22:

As Colunas “B” e “J”, estão presentes em todos os templos maçônicos e sua posição varia conforme o Rito.
Nos Ritos: Escocês, York, Schroeder, a Coluna “B” fica à esquerda e a “J” à direita. Nos Ritos: Francês e Adonhiramita as posições são invertidas.

Os Três Degraus antes do Pórtico, representam a idade do Aprendiz, correspondente ao tempo que os Maçons Operativos necessitavam para serem elevados ao Grau de Companheiro.

Somente após vencer os Três Degraus, isto é, o tempo de permanência no 1º Grau, é que o Aprendiz atingia o pórtico e entrava na obra que se estava construindo.

As romãs semiabertas nos capitéis das colunas, divididas internamente por compartimentos cheios de considerável número de sementes, sistematicamente dispostas e intimamente unidas, lembram a fraternidade que deve haver entre todos os homens e, sobretudo entre os Maçons.
As romãs representam assim, a família maçónica universal, cujos membros estão ligados harmonicamente pelo espírito da ordem e da fraternidade.

3.   O Nível
Sob o ponto de vista operativo, com o Nível é possível verificar, se uma superfície está livre de arestas, pois, a planificação do alicerce de uma obra é fundamental para sua correta sustentação

É a joia simbólica do 1º Vigilante, sendo aquele que em Loja, promove o igual tratamento, não se reconhecendo as distinções existentes no mundo profano. O Nível é o símbolo da igualdade, da igualdade fraterna, com que todos os maçons se reconhecem.

4.   Régua 24 polegadas
A régua, por excelência, é um instrumento de medida. Através dela é possível obter a informação sobre a longitude de uma dimensão espacial.
O número 24, associado à régua, é primeiramente referido às horas do dia. Em número de 24, divididas em três períodos iguais de oito horas, sugere que o homem deve ocupar com equilíbrio o seu dia em descanso, trabalho, e a serviço do seu Deus ou de um irmão necessitado.
A lição que o Aprendiz deve obter da régua de 24 polegadas é da proporcionalidade e retidão com que deve ocupar o seu tempo

5.   Maço e Cinzel
O Maço é a energia, a contundência, a força e a decisão necessárias para que o Aprendiz progrida no seu trabalho, não esmorecendo ao primeiro revés.
Quando utilizado de forma desordenada, o maço pode-se transformar numa poderosa ferramenta de destruição, porém, o seu uso disciplinado torna-o  num instrumento indispensável.

O Cinzel simboliza a inteligência que o Maçom deve empreender para desbastar a Pedra Bruta.
É um instrumento utilizado para trabalhos que exijam apuro e precisão, formado por uma haste de metal em que um de seus lados é perfuro-cortante e o outro apresenta uma cabeça chata onde recebe o impacto do Maço, dirigindo a força daquele de forma útil.

A associação do Maço com o Cinzel mostra-nos que a vontade e a inteligência, a força e o talento, a ciência e a arte, a força física e a força intelectual, quando aplicadas em doses certas, permitem que a Pedra Bruta se transforme em Pedra Cúbica

6.   Pedra Bruta / Pedra Cúbica Piramidal
A Pedra Bruta simboliza o Aprendiz, que nela vai trabalhar, desbastando e marcando-a, até que seja julgada polida pelo Venerável Mestre.
Ela representa o homem na sua infância ou estado primitivo, sem instrução, áspero e despolido, com as paixões a dominarem a razão e o que nesse estado se conserva até que, pela instrução maçónica, pelo estudo adquira instrução superior.

7.   A Lua, o Sol e as estrelas
Decoram o templo simbolizando o universo e os atros que iluminam a abóbada celeste.
O Sol, e a Lua representam o antagonismo da natureza, o dia e noite, a afirmação e a negação, o claro e o escuro, que, contraditoriamente, gera o equilíbrio, pela conciliação dos contrários.
As diversas Estrelas distribuídas irregularmente no Painel do 1º Grau do Rito Escocês Antigo e Aceite simbolizam a universalidade da Maçonaria e lembra que os Maçons, espalhados por todos os continentes, devem, como construtores sociais, distribuir a luz dos seus conhecimentos a todos os que ainda estão cegos e privados do conhecimento da verdade.

8.   Olho que tudo vê
Os cristãos chamam-no de Olho da Providência e o representam-no dentro do triângulo que representa a Santíssima Trindade - Pai, Filho e Espírito Santo. Para os cristãos esse símbolo representa a onisciência e a onipresença de Deus.
Este símbolo para nós maçons, alude ao “Grande Arquiteto” que observa e acompanha as ações dos membros da Ordem, com o intuito de que todos ajam de forma correta

9.   Esquadro e compasso
O Esquadro como joia do Venerável Mestre, indica que ele deve ser o Maçom mais reto e mais justo da loja, servindo como paradigma para todos os obreiros.
É símbolo da retidão, da moralidade, pois que conjuga, por sua forma, o Nível e o Prumo.
Enquanto a linha horizontal do Esquadro representa a trajetória a ser percorrida na terra, o determinismo, o destino, a vertical indica o caminho para cima, dirigindo-se ao cosmo, ao Grande Arquiteto do Universo

O compasso simboliza a vida correta, pautada pelos limites da Ética e da Moral. Ou ainda o equilíbrio. Ou a também a Justiça. Porque o compasso serve para traçar circunferência, delimitando um espaço interior de tudo o que fica do exterior dela, assim se transpõe para a noção de que a vida correta é a que se processa dentro do limite fixado pela Ética e pela Moral

A conjugação destes dois símbolos constitui provavelmente o símbolo mais conhecido da Maçonaria através de um esquadro, com as pontas viradas para cima, e um compasso, com as pontas viradas para baixo.

10. 3 Janelas
Representam as 3 portas do reino de Salomão

11.  Pedra Cúbica
A Pedra Cúbica representa o Companheiro. É o material perfeitamente trabalhado, de linhas e ângulos retos.
Simboliza o homem desbastado e polido de suas asperezas, educado e instruído, pronto para ocupar seu lugar na construção de um mundo melhor.

12. O Prumo
O Prumo permite aferir a retidão de uma parede quando está a ser construída, de forma a garantir sua estabilidade
Simbolicamente, o Prumo possibilita a verificação correta e fundamenta o correto crescimento intelectual do maçon, trazendo o conhecimento necessário que possibilitará a aplicação precisa da força através da razão.
É simbolicamente a joia do 2º Vigilante e deve ser usada para verificar qualquer inclinação, qualquer saída do Prumo, que possa acontecer durante a aprendizagem, corrigindo-a a tempo.

13. Corda de 81 nós
Tradicionalmente, na Maçonaria, os operativos empregavam cordas com nós amarrados a distâncias iguais, para efetuar medições das distâncias no canteiro de obras e esquadrejar grandes ângulos. Isso permitia-lhes traçar os planos de construção das obras que realizavam.
Este método é utilizado ainda hoje por mestres de obra, quando precisam achar o esquadro da fundação de uma obra.

As catedrais antigas eram orientadas de modo que seus eixos ficassem no sentido Oriente-Ocidente e os mestres de obras dominavam as regras da astronomia que lhes permitiam determinar com exatidão a orientação deste eixo. Uma estaca era fincada no terreno, sobre este eixo, no ponto indicado pela seta da figura em baixo




Considerando o Teorema de Pitágoras, onde o quadrado da hipotenusa é igual à soma dos quadrados dos catetos temos:
 Hipotenusa = 5 segmentos ou  5×5=25
Cateto menor = 3 segmentos ou 3×3=9
Cateto maior = 4 segmentos ou 4×4=16
Considerando a fórmula de Pitágoras, o quadrado da hipotenusa é igual à soma do quadrado dos catetos, temos:
25 = 9+16 e isso assegura que o ângulo tenha exatamente 90º.
Imaginemos que fossem construir uma grande catedral. Precisavam de algo mais que um metro para medir as grandes distâncias e assim utilizavam as cordas com nós atados a distâncias regulares e estacas, de acordo com a escala utilizada.

14. O Alfabeto Maçónico



Fontes:

RPGF








22 maio 2017

A aventalite


A aventalite é uma afeção que assola alguns maçons, geralmente de forma aguda, passageira e facilmente curável, mas podendo evoluir para uma forma crónica, essa necessariamente mais séria e com um tratamento mais demorado e cura mais problemática.

Manifesta-se por uma despropositada inflação do ego, injustificada sensação de superioridade, perturbador sentimento de poder e, nos casos menos ligeiros, inadequado comportamento em relação aos seus iguais, vistos pelo afetado como inferiores ou subordinados, por não usarem aventais XPTO.

A aventalite é suscetível de atacar Grandes Oficiais e dignitários de Altos Graus, independentemente da Obediência, seja Grande Loja ou Grande Oriente, assuma orientação mais anglo-saxónica ou mais francesa, e pode atacar tanto homens como mulheres, embora empiricamente pareça ser mais frequente naqueles.  

O tratamento da sua forma aguda é fácil e geralmente eficaz, se aplicado na fase inicial da doença. Consiste numa severa e sonora censura, com solene declaração de que se não tem paciência para aturar maneirices de armados em mete-nojo, acompanhada de expressa chamada de atenção para a Igualdade que obrigatoriamente reina entre os maçons e uma injeção de recordatória de que o exercício de ofícios em Grande Loja ou Grande Oriente ou funções em Altos Graus são meros serviços, tarefas, ofícios a serem desempenhados com zelo e humildade e não honrarias ou reconhecimentos de inexistentes superioridades.

Nos casos mais graves, pode ser necessário um reforço de tratamento com recurso a expressões vernáculas, envios para determinados sítios não propriamente prestigiados  e solenes avisos de que, ou o afetado atina e deixa de se continuar a armar ao pingarelho, ou é melhor continuar a enganar-se dando voltas ao bilhar grande, que junto dos seus iguais (quer ele queira, quer não) não vai ter grande sorte.

Nas formas mais leves da afeção, e sobretudo quando o doente é de boa índole, o tratamento mais suave chega para debelar a afeção, sem sequelas. Podem, no entanto, ocasionalmente observar-se recaídas, em regra facilmente tratáveis com uma observação chocarreira e bem-humorada, como, por exemplo, Lá estás tu outra vez a deixar o aventaleco janota subir-te à cabeça. Deixa-o lá sossegadimho e não te estiques, que és melhor que isso...

Nas formas mais severas, afeção prolongada ou doentes com obtusidade cerebral, é indispensável o tratamento reforçado, repetido as vezes que forem necessários até o doente ir ao sítio. No entanto, quer a índole mais difícil do doente, quer a maior agressividade do tratamento podem dar origem a efeitos secundários ou sequelas desagradáveis, designadamente amuos e afastamentos. Nas situações verdadeiramente graves e reincidentes pode mesmo ser necessário aplicar quarentena.

A aventalite é uma afeção oportunista que se manifesta com mais frequência em ambientes poluídos por regras, expressas, implícitas ou consuetudinais, que favoreçam, ou mesmo imponham, o uso com demasiada frequência e em locais inapropriados de aventais XPTO. O oportunismo da aventalite aproveita qualquer desatenção que permita ou propicie o uso desadequado e fora do seu ambiente próprio dos ditos aventais XPTO.

Para além do tratamento dos casos concretos dos afetados pela doença, é importante que se faça adequada prevenção, para evitar novas infeções, recidivas e recaídas.

Recomenda-se assim revisão das normas regulamentares e das práticas que não limitem o uso dos aventais XPTO aos locais e ocasiões adequados. Designadamente, é de toda a conveniência que se tenha presente que, na sua Loja, o obreiro é um elemento do Quadro desta, absolutamente igual aos demais, nem mais, nem menos que qualquer dos outros e, que, consequentemente, fique inquestionavelmente assente que nenhum obreiro, na sua Loja, usa avental XPTO, antes devendo usar o avental do seu grau e, se for caso disso, a insígnia da sua qualidade na Loja, sendo absolutamente indiferente posição ou ofício que porventura tenha na Grande Loja, Grande Oriente ou nos Altos Graus. A Loja é independente e livre e em nada inferior à Grande Loja ou Grande Oriente (pelo contrário, é a Loja que, juntamente com as outras, determina a regulamentação essencial da Grande Loja ou Grande Oriente e elege o seu responsável máximo). Esta regra deve ter como única exceção - certamente ocasional - a situação em que o obreiro se apresente na Loja, não na sua qualidade de obreiro dela, mas no efetivo exercício da sua função de Grande Oficial ou em representação expressa do Grão-Mestre. 

Este princípio deve ser extensivo à visita a outras Lojas. Se o obreiro faz visita a título pessoal, não faz sentido, e propicia a aventalite, que use outro avental que não o do seu grau. Se a deslocação, porém, se fizer no exercício das suas funções de Grande Oficial ou em representação do Grão-Mestre, então, e só então, justifica-se que use o seu avental XPTO.

Claro que, em Assembleias de Grande Loja ou Grande Oriente, aí sim, está-se em pleno espaço e tempo em que é justificado e adequado o uso de aventais XPTO. Aí e nessas ocasiões, não há qualquer inconveniente. Trata-se de um uso moderado e adequado de avental XPTO, que, por regra, não propicia nem aumenta o risco de contágio pela irritante aventalite.

A bem da saúde dos maçons, exorto a que esta atividade de prevenção seja feita. É saudável. é amiga do ambiente e, sobretudo, é... maçónica!

Rui Bandeira  

14 maio 2017

“Chegadas e Partidas…”

Este é o último texto que irei partilhar com os nossos leitores nos próximos tempos…

Serão dias, semanas, meses ou quiçá anos, somente o GADU o decidirá.

A Maçonaria faz-se de chegadas e de partidas, tudo tem um tempo, um tempo próprio para fazer, seja ritual ou não. A própria evolução do Homem é temporal, sem Tempo ela não se cumpre.

E no meu caso pessoal o meu tempo foi este!

Já alguém dizia que “Tempus Fugit” e é verdade, ele passa sem darmos-nos conta da sua passagem. Passaram, sensivelmente, cerca de 2 anos e oito meses que iniciei aqui o meu percurso como membro do painel de autores neste blogue,  tendo saído da minha caneta cerca de 50 textos e republicado cerca de 25 outros tantos textos de autores membros do painel deste blogue.

Sempre fiz esse trabalho de escrita com a motivação da partilha de “saberes” que eu poderia deter e fí-lo despretensiosamente e despreocupadamente, ou seja, fí-lo porque senti que era meu dever o fazer… Maçonaria também é isto: trabalhar, ensinar, partilhar…

Por isso mesmo é com a tranquila consciência com que parto, pois tudo fiz sem nada pretender em troca, nem vãs glórias ou “metais”; e é isso que motiva o Nuno Raimundo nesta sua caminhada…  
Apenas o labor constante me impele a ir mais longe e simplesmente isso, nada mais...

Certamente que alguns  leitores ficaram mais próximos de mim, do meu pensamento maçónico, através da leitura das publicações que eu ia fazendo, certamente também passaram – se o desejaram fazer! - a ter outra imagem do que a Maçonaria é e trata. Pouco mais posso eu fazer neste momento para lhes demonstrar o que ela é na realidade a não ser através da minha acção pessoal na sociedade, sendo que tal é feito pela minha conduta e forma de estar e no relacionamento com os demais.

Cheguei  e agora parto, e posso afirmar que a minha permanência durante este tempo por aqui  foi um  processo árduo, de busca, procura de conhecimento, estudo, pois o que me esperava não era uma tarefa fácil mas antes uma demanda difícil, até porque tinha a consciência – e ainda a tenho ! - de que a fasquia era elevada tal a qualidade dos meus pares e do próprio blogue em si. E por isso tinha a verdadeira noção de que não poderia executar nada que fosse abaixo do “bom”. A própria Respeitável Loja Mestre Affonso Domingues nº5 assim o exige aos seus membros!

Honestamente não sei se assim o foi… Mas quero assumir e vos dizer que também que o que fiz e que neste espaço partilhei tiveram sempre razão de o ser e sempre considerado, por mim, como uma mais valia para o conhecimento dos demais. Espero não ter falhado com tal propósito.

Agora é tempo de me ir… A mudança, a evolução, tem destas coisas e tal não (me) é indiferente.
Irei fazer parte do Quadro de Obreiros de outra Respeitável Loja e dessa forma não poderei, para já, continuar a colaborar neste espaço.
Mas deixar de escrever não significa abandono. Irei continuar a ler, a participar como comentador; apenas não estarei ao lado de quem “escreve” mas antes no outro lado, ao Vosso lado, dos meus/nossos queridos leitores.

Muito Obrigado aos meus muito estimados Irmãos pelo tempo em que estive por aqui ao vosso lado e muito obrigado também aos nossos caríssimos leitores pelo tempo que disponibilizaram para ler e/ou comentar o que por mim foi traçado neste muito respeitável blogue.

Inté…

08 maio 2017

Da ilusória natureza do Poder em Maçonaria


Na Loja Mestre Affonso Domingues, fora de religião e política, tudo é suscetível de ser discutido e tudo se discute, por vezes acaloradamente. Mas, até hoje, há algo a que a Loja teve o bom-senso de nunca se sujeitar: uma pugna eleitoral. Na nossa Loja, desde há muito que é consensual que o Primeiro Vigilante de um ano é, no ano seguinte, o Venerável Mestre e o Segundo Vigilante de um ano será, no ano seguinte, Primeiro Vigilante e, no subsequente, Venerável Mestre. As exceções a esta regra consensual contam-se pelos dedos de uma mão e ainda sobram dedos (curiosamente, uma dessas exceções envolveu-me a mim, como já neste blogue referi, no texto A ultrapassagem).

Quando imponderáveis se atravessam e assim não pode ser feito, por impossibilidade de o Primeiro Vigilante assumir a função de Venerável Mestre (sucedeu tal, não há muito tempo, na Loja: o Primeiro Vigilante de um ano não pôde assumir no ano seguinte o ofício de Venerável Mestre, porque entretanto foi profissionalmente colocado no estrangeiro), avança o Segundo Vigilante para o ofício.

Até hoje, não ocorreu situação de ambos os Vigilantes não poderem ou não quererem, em simultâneo, assumir o ofício de Venerável Mestre. Mas, se porventura tal ocorrer, não seremos apanhados de surpresa... A maneira de resolver esse imprevisto já tem sido conversada, pela melhor forma de o fazer: pensar em abstrato, sem o constrangimento de uma situação concreta. Nessa situação, existe um constrangimento regulamentar: só pode exercer o ofício de Venerável Mestre quem tenha previamente assegurado o exercício de, pelo menos, um dos ofícios de Vigilante. Como os Vigilantes naturalmente em seguida exercem o ofício de Venerável Mestre, só muito excecionalmente haverá um obreiro da Loja que tenha exercido o ofício de Vigilante e não tenha já passado pela Cadeira de Salomão (como será o caso, quando regressar do estrangeiro, do Irmão que, tendo sido Primeiro Vigilante, não pôde assumir o ofício de Venerável Mestre). Se essa exceção ocorrer e o obreiro estiver disponível para o ofício, deverá ser-lhe dada prioridade, evitando repetição de Venerável Mestre. Quando essa exceção não ocorrer, avança um dos Antigos Veneráveis. Qual? O mais antigo que tiver disponibilidade para tal.

Em suma, haverá sempre uma solução!

O que importa sublinhar é que, na nossa Loja, até agora não houve, e estamos determinados a que não haja, lutas eleitorais. Porque dividem, porque deixam sequelas entre Irmãos e, acima de tudo, porque tais lutas eleitorais contrariam a natureza do Poder em Maçonaria.

Com efeito, bem vistas as coisas, em Maçonaria o Poder é meramente ilusório. A Maçonaria é uma instituição assente completa e absolutamente na disponibilidade VOLUNTÁRIA dos seus membros. Adere à Maçonaria quem manifestar vontade nisso e for admitido. O Mestre Maçom integra a Loja em que voluntariamente se decide integrar, sendo cada um livre de, a qualquer momento, mudar de Loja. Apenas se faz o que cada um voluntariamente entender dever fazer. Se é certo que existe o dever de não violar decisão do Venerável Mestre da Loja, não é menos certo que nada obriga ao cumnprimento dessa decisão, se o obreiro entender não o fazer. Dito por outras palavras: o obreiro tem o dever de não obstaculizar, não contrariar, decisão do Venerável Mestre, mas tem o direito de não a executar, se com ela não concordar. Porque a Maçonaria assenta na Liberdade individual e em caso algum pode violar a consciência individual de um dos seus obreiros.

Assim sendo, é corolário evidente que, não podendo nenhum obreiro ser obrigado a executar decisão do Venerável Mestre com que não concorde, o Poder do Venerável Mestre é meramente ilusório, só tornando efetivas e eficazes as suas decisões, na medida em que as mesmas mereçam a concordância de um número significativo de obreiros.

E há também um segundo corolário a ter em atenção. Porque assim é, porque o Poder do Venerável Mestre assenta na aceitação, na concordância, em relação a cada uma das suas decisões, são indiferentes eventual unanimidade que porventura haja na eleição do Venerável Mestre ou eventual existência de bolsa de descontentamento ou desconfiança em relação a um Venerável Mestre que esteja na altura de assumir o ofício. Em Maçonaria, não há "estado de graça", nem "primeiros cem dias". Isso são conceitos profanos e modas passageiras. A valia de um Venerável Mestre não se afere pelos apoios, loas ou críticas que tenha à partida. Resulta dos juízos que sobre a sua atuação forem feitos no final do seu mandato, quando tiver concluído a sua tarefa. Porque, em bom rigor, os apoios existem - ou não - em relação a cada uma das suas medidas, a cada uma das suas decisões, a cada uma das suas escolhas. Estas - as medidas, as decisões e as escolhas - é que importam e estas é que permitirão, no final, avaliar o valor do mandato de quem as tomou.

É assim estulto reunir aparatosos apoios antes de iniciar o mandato ou temer eventuais discordâncias antes de se saber que concretas decisões se toma. Tão injustificada é a vã confiança do que porventura se sinta levado em ombros para a Cadeira de Salomão, como o temor do que porventura preveja vir a ter discordantes de si. 

Em Maçonaria, o único verdadeiro Poder é o da Persuasão!

Rui Bandeira

01 maio 2017

Respeitável Loja Mestre Affonso Domingues, n.º 5


Cada Loja é um mundo particular. No que tem de bom e no que que tem de menos interessante. A Loja Mestre Affonso Domingues não foge à regra. Uma das suas características é que no seu seio tudo (tudo não: religião e política estão excluídas) pode ser debatido. E o nosso conceito de debate inclui, naturalmente, a livre expressão da opinião de cada um de nós de forma franca, aberta e cara-a-cara. O que cada um acha que tem de ser dito, diz. Se se exceder, é chamado à pedra e dá as suas explicações e, se necessário apresenta o seu pedido de desculpas. Mas disse, não guardou dentro de si. 

Claro que quem diz sujeita-se a ouvir... Entre nós, portanto, ninguém engana ninguém. Todos dizem o que pensam, ouvem o que têm que ouvir, toda a gente fica a perceber as posições, as razões, os sentimentos, os estados de alma de cada um. E depois chega-se coletivamente a uma conclusão.

Quando há que debater, debate-se. Estejamos sós ou tenhamos visitantes connosco. Às vezes, surprendemos alguma surpresa nos olhos de visitantes... Somos assim, sentimo-nos confortáveis assim, não há razão para escondermos como somos... Poderemos ser acusados de muita coisa. De hipocrisia é que, com justiça, não!

Mas o mesmo visitantre que porventura arregale os ohos ao assistir aos debates entre nós, se (ou quando) nos conhecer bem também percebe outra coisa. Podemos debater, podemos confrontar-nos, podemos resmungar, mas, se alguém de fora tentar pisar os calos a um de nós tem de se haver com todos, juntos e sem fissuras. 

Nós debatemos este mundo e o outro. Às vezes, discutimos, resmungamos, desabafamos e atiramos argumentos como petardos. Mas fazemo-lo assim porque podemos. Porque os nosso debates, as nossas querelas, têm subjacente que todos somos irmãos e todos somos iguais. Como os irmãos de sangue, podemos ter brigas sérias, ultrapassadas e esquecidas trinta segundos depois. Porque todos somos iguais e nos consideramos e tratamos efetivamente como irmãos é que podemos esgrimir argumentos como punhais, sem receio de criar situações inultrapassáveis. Falamos francamente - e, por vezes, com dureza - porque reconhecemos aos nossos iguais e irmãos o direito de falarem connosco com igual franqueza e, por vezes, dureza. No final, podemos não concordar todos com tudo (que aborrecimento de Loja que seria...), mas todos ouvimos todos, todos podemos perceber as razões, as motivações, as preocupações, dos outros. Todos nos abrimos perante os demais. Compreendemos os demais e demo-nos a compreender aos demais. 

E depois, plácida e naturalmente, formamos a nossa Cadeia de União. E não é nada raro, nem incomum, nem motivo de qualquer espanto, que dois manos que minutos antes bravamente se digladiaram estejam lado a lado dando-se as mãos nessa Cadeia de União e, juntos, participem no momento de reflexão e comunhão coletiva.

E também não é nada raro que, no pico de uma acesa troca de argumentos, alguém largue uma piada e todos - trocadores de argumentos incluídos - se unam em saudável gargalhada, prosseguindo-se depois o debate, com naturalidade e á-vontade.

Finda a sessão de Loja, vamos todos jantar. E todos estão lado-a-lado e frente-a-frente, descontraídos e confiantes uns nos outros. Por vezes - tantas vezes! - os mesmos que se atiraram antes argumentos e contra-argumentos ali, à mesa, combinam estratégios, acertam soluções, para, em conjunto, conseguirem ultrapassar qualquer problema, resolver uma questão, intervir ajudando um irmão, o que quer que seja.

Na nossa Mestre Affonso Domingues, nós não discutimos: afinamo-nos mutuamente; não nos digladiamos: damos e recebemos incentivos para sermos, nós e os outros, melhores. Afinal, não fazemos nada de mais: é assim que os irmãos se comportam enre si...

Às vezes fazemos coisas boas. Às vezes estamos de pousio. Mas todos juntos! Os últimos quatro ou cinco anos foram duros e difíceis para a sociedade portuguesa. Foram duros e difíceis para alguns de nós. A Loja inevitavelmente que sentiu essas dificuldades. Muito teve de se aguentar. Algo teve de se providenciar. Não fizemos sempre tudo certo. Tomaram-se decisões com que nem todos concordaram. Mas agora cá estamos para prosseguir e iniciar novo ciclo. Crendo que o pior já passou. Mais bem preparados, porque atravessámos tempos difíceis juntos e juntos seguimos para o que esparamos sejam épocas melhores.

Por isso, se um dia destes alguém nos visitar e deparar com o nosso à-vontade em, sem pudores, debatermos algo, não se admire, nem se inquiete. Há muito que procedemos assim. Afinal, é assim que as famílias procedem. Afinal só quem for filho único é que não experimentou as brigas de irmãos, tão ferozes como espetacular tempestade, mas afinal tão inócuas que permitem que, momentos depois, se brinque, se galhofe, se conviva, se construa o essencial comum sem problemas com circunstanciais desacordos.

A Loja Mestre Affonso Domingues é, afinal, uma grande família, já com mais de 25 anos de história familiar. Onde cada um pode ser, e é, ele próprio e é assim aceite e respeitado. E aceita e respeita os demais. Mais picardia, menos resmungo, isso são detalhes, meras estratégias para da individualidade de cada um construirmos e mantermos a identidade comum de todos.

É das diferenças entre nós que se cimenta a nossa Força coletiva!

É por isso que, com a nossa indisciplina, com os nossos acordos e desacordos, debates e confrontos, cooperações e realizações, todos estamos orgulhosamente conscientes de uma coisa: pode ser que seja só para nós - mas, para nós, a nossa Mestre Affonso Domingues é a melhor Loja do mundo - e arredores!

Rui Bandeira

30 abril 2017

Fim do Ciclo



É propósito deste blog ser uma espécie de voz digital dos saberes da Respeitável Loja Mestre Affonso Domingues.

No seu critério editorial a publicação de textos está restrita aos Mestres Maçons da Loja e a convidados.

Hoje termina a minha condição de Mestre Maçon da Loja. Termina o percurso nesta Loja continuando noutra.

Hoje fecho aqui a minha participação, que nos últimos anos por força de funções desempenhadas tem sido quase inexistente.

Um Agradecimento a todos os leitores.

Um abraço a todos os demais escribas.

José Ruah

24 abril 2017

Respeitável Loja Comércio e Artes, n.º 99


Algo que é inerente à vida maçónica é a visita a outras Lojas. Por essa forma, o obreiro pode apreender as semelhanças e diferenças que existem entre a Loja que visita e a sua própria Loja e rapidamente se apercebe que, mesmo com diferenças, apesar das variantes, é a mesma Maçonaria que se pratica. Podem os rituais ser diferentes, podem as palavras e os gestos e movimentos ser diversos, pode a prática e a forma de execução ser dissemelhante, mas o espírito e o propósito são exatamente os mesmos.

Só raramente visito outras Lojas. Mais raramente do que gostaria e muito mais do que deveria. Mas recentemente - um dia não são dias... - tive oportunidade de, aproveitando uma deslocação e estada no Porto, visitar a Respeitável Loja Comércio e Artes, n.º 99. Esta Loja tabalha no Rito Adonhiramita, um rito que nasceu em França em meados do século XVIII, foi introduzido em Portugal no século XIX e daqui migrou para o Brasil, onde adquiriu assinalável expansão. Entretanto, caiu em desuso em Portugal, até que há alguns anos, fez o percurso inverso e, do Brasil, reintroduziu-se em Portugal, sendo agora um dos cinco ritos e rituais praticados pela GLLP/GLRP (os outros quatro são o Rito Escocês Antigo e Aceite, o Rito Escocês Retificado, o Rito de York e o Ritual de Emulação).

O Rito Adonhiramita tem evidentes diferenças em relação àquele que se pratica na Loja Mestre Affonso Domingues, o Rito Escocês Antigo e Aceite. Mas a ideia, o propósito, o objetivo, são exatamente os mesmos. Assistir à execução do Rito Adonhiramita pelos Irmãos da Respeitável Loja Comércio e Artes, n.º 99, foi uma agradável suspresa. O rito é bonito e apelativo. Foi muito bem executado por todos os Oficiais, com um justo destaque para o Irmão que executou o ofício de Mestre de Cerimónias. Não era o Oficial titular, mas não se notou...

Em menos de duas horas de trabalhos - que passaram depressa... - foram apresentados dois trabalhos por dois Irmãos Aprendizes e uma Prancha Traçada por um Irmão Mestre. Todos os trabalhos mostraram qualidade acima da média, revelando-se claramente que a Loja está a trabalhar muito bem, a formar convenientemente os seus Aprendizes e todos os seus obreiros.

A Respeitável Loja Comércio e Artes, n.º 99, é uma Loja recente e, portanto, ainda com um pequeno número de obreiros. Mas vê-se ali muita qualidade e sente-se espírito de união. Auguro um muito agradável futuro a esta Loja. Repetindo aqui o que tive oportunidade de referir na sessão da Loja, acho justificado fazer a esta Loja o maior elogio que eu lhe poderia fazer: estar nesta Respeitável Loja Comércio e Artes, n.º 99, assistir aos seus trabalhos, ver a correção e o empenho de todos, sentir a exemplar união ali existente, transportou-me à minha Loja Mestre Affonso Domigues, nº 5, de há vinte e cinco anos atrás. Estou, pois, certo, que esta nova Loja fará um percurso, terá uma evolução, pelo menos tão agradável como foi a da minha Loja. A qualidade está lá. O espírito de união também. A capacidade, idem!

Após os trabalhos, tive o gosto de acompanhar os Irmãos no ágape, de são e agradável convívio. Mais uma vez, senti-me em casa...

Agradeço ao Venerável Mestre  e a todos os Irmãos da Respeitável Loja Comércio e Artes, n.º 99, a excelente receção que fizeram o favor de me proporcionar. Espero vir a ter oportunidade de repetir a visita. Reitero o convite que a todos fiz de que, quando possam, venham visitar a Loja Mestre Affonso Domingues. Sobretudo, recomendo a todos os Irmãos da GLLP/GLRP que visitem esta Loja. Asseguro-vos que não darão o vosso tempo por perdido. Encontrarão um Ritual interessante, muito bem executado, trabalhos empenhados e de qualidade, uma atmosfera de comunhão e amizade entre todos. Em suma, Maçonaria no seu melhor!

Rui Bandeira 

17 abril 2017

Os senadores


Esta é uma denominação ou classificação que não existe em Maçonaria. Coloquialmente, é uma expressão que, na nossa Loja, é usada para referir os elementos mais antigos dela. Dir-se-ia que é uma expressão desnecessária, que pode muito bem referir-se o mesmo grupo simplesmente como Mestres Instalados. Mas, em bom rigor, nem todos os Mestre Instalados são senadores da Loja e pode muito bem haver senadores da Loja que não são Mestres Instalados. 

Mestres Instalados são os Mestres da Loja que exerceram o ofício de Venerável Mestre e é aquele que, no momento, tem a responsabilidade de dirigir a Loja. A designação resulta de a tomada de posse, digamos assim, do ofício de Venerável Mestre se realizar através de uma cerimónia em que o eleito para exercer a função é instalado no assento onde toma lugar o Venerável Mestre, designado por Cadeira de Salomão. Mestres Instalados são, portanto, elementos experientes da Loja, que exerceram vários ofícios da Loja antes de serem eleitos para o de Venerável Mestre e, em consequência, terem sido instalados na Cadeira de Salomão. Mas o conceito coloquial de senadores que é usado na nossa Loja é ligeiramente diferente.

Para nós, um senador da Loja é um elemento que, pela sua antiguidade e pela sua assiduidade adquiriu uma noção de como é a Loja, como ela funciona, como ela reage, das suas virtudes e dos seus defeitos, que é reconhecida pelos demais, que, por isso mesmo, dão especial atenção aos seus conselhos e propostas para resolução de qualquer problema ou definição do rumo da Loja.

Nem todos os Mestres Instalados são reconhecidos pelos demais como senadores da Loja, porque, por vicissitudes várias, reduziram ou interromperam, durante algum tempo, a sua assiduidade na Loja, com inevitável reflexo na diminuição do seu profundo conhecimento dela e da sua evolução. 

Mas também haverá senadores da Loja que vão sendo reconhecidos como tal, apesar de não terem (ainda) exercido o ofício de Venerável Mestre. São assíduos, são participativos, conhecem a Loja a fundo. Só não exerceram (ainda) o ofício de Venerável Mestre porque tal anda não se proporcionou. E repare-se que tive o cuidado de não utilizar o conceito de Mestre... É que, por exemplo, na nossa Loja existe um Aprendiz que, por vontade própria, permanece nesse grau há vários anos, não aceitando passar ao grau seguinte... Como na nossa Loja (e deve suceder em todas as Lojas) o respeito pela individualidade dos seus obreiros é total, não há nenhum problema nisso. Periodicamente, pergunta-se a esse Irmão se é tempo de seguir adiante. Ele tem vindo sempre a responder que não. Respeita-se a sua opção e decisão. Claro que, ao fim de significativo tempo, já se brinca um pouco com isso, mas não deixa de se respeitar a opção deste nosso Aprendiz. Um dia destes, ainda criamos, só para ele, a figura de Aprendiz-Mor...! E suspeito que tempo virá em que, mesmo Aprendiz - se persistir em nesse grau permanecer - outro dia destes este "Aprendiz-Mor" adquire, por direito próprio, o estatuto de senador da Loja...

Os senadores da Loja, por tão bem a conhecerem, podem fazer-lhe muito bem, mas também podem causar-lhe grave dano. 

Serão benéficos para a Loja se derem o seu conselho, formularem a sua opinião, mas resistirem à tentação de procurarem impor os seus pontos de vista. Ao contrário do que sucede na vida militar, a antiguidade não é posto. E também não constitui garantia de se estar certo, de se ter razão. E, mesmo quando está certo, o senador deve sempre ter presente que os mais novos têm direito ao erro, que porventura até necessitarão de cometer erros, de suportar as consequências deles e de os superar. Tal como sucedeu com o senador, que seguramente não foi infalível e evidentemente que cometeu a sua quota-parte de erros.

Serão perniciosos para a Loja os senadores que, por convencimento ou falta de cautela, se derem demasiada importância a si próprios, à sua experiência, ao seu conhecimento da Loja, e insistirem em tentar impor os seus pontos de vista, as suas ideias, e busquem conduzir a Loja pelos caminhos que lhes suscitem os seus amores e os seus temores. Porque isso é arrogar-se ser dono da Loja e isso a Loja não lho permite. Com ou sem experiência. Mesmo conhecendo e respeitando toda a assiduidade e dedicação.

No fundo, a questão é sempre a mesma: o principal princípio que impera na Loja é a essencial Igualdade entre todos. Podem uns iguais atentar com especial atenção em iguais mais antigos e mais experientes. Nunca - e fazem muito bem! - aceitarão anular-se ou prestar injustificada vassalagem ao senador só porque o é. Tal como um maçom só o é porque é reconhecido como tal pelos seus Irmãos, a influência do senador na Loja é apenas aquela que os seus Irmãos lhe reconheçam.

É assim que deve ser . E, senador ou não, se porventura algum dia alguém se esquecer disto, corre o risco de falar, falar, falar, convencido de que convencerá os demais a seguirem o caminho que as suas palavras iluminam e, quando se der conta, verificar que está, afinal a falar sozinho...

Rui Bandeira

10 abril 2017

O obreiro e o Grande Oficial


Sempre que um obreiro de uma Loja é eleito ou designado Grande Oficial é uma satisfação para essa sua Loja e os que a integram. Para além do mais, é um reconhecimento do valor do obreiro e esse resulta também do trabalho da Loja. Mas, assim sendo, devem ambos, obreiro e Loja, estar cientes que esta situação implica a necessidade de alguns ajustamentos, seja em termos de disponibilidade do obreiro em relação à Loja, seja sobretudo em termos de relacionamento entre o novel Grande Oficial e os demais elementos da sua Loja.

Quanto às consequências para a disponibilidade do obreiro em relação à sua Loja, dependem as mesmas do tipo de ofício  que o Grande Oficial vai desempenhar. Haverá poucos constrangimentos se se tratar de um ofício com atividade essencialmente ritual e exercida em sessões de Grande Loja. Nesse caso, o obreiro poderá manter a sua disponibilidade praticamente total para a sua Loja, pois apenas estará impedido no decurso das sessões rituais de Grande Loja e terá só que compatibilizar as suas tarefas em Loja com o estudo e preparação da sua intervenção ou atuação enquanto Grande Oficial. Já se o ofício na Grande Loja for de natureza administrativa ou implicar alguma dedicação de tempo, inevitavelmente que a participação e colaboração na Loja do Grande Oficial que assumiu esse tipo de responsabilidade se ressentirá. 

Esta necessidade de afetação de tempo ao cumprimento de ofício de Grande Oficial deve sempre estar presente no espírito do obreiro, de modo a que este salvaguarde o justo equilíbrio entre a sua disponibilidade e o cumprimento das suas obrigações e o seu desempenho, quer perante a Grande Loja, quer perante a Loja. Tocar demasiados instrumentos em simultâneo faz com que nenhum seja executado com a devida qualidade... Assim, o obreiro deve estar sempre consciente das limitações decorrentes do exercício de ofício em Grande Loja em relação à sua Loja e necessita de utilizar, mais frequentemente do que desejaria, a palavra "não". Não aceitar tarefas que, por colidirem com o ofício em Grande Loja ou com o tempo que precisa de lhe dedicar, não poderá vir a cumprir com qualidade e eficiência é imposição de bom senso. Por sua vez, a Loja e os seus responsáveis deverão ter sempre presente a limitação que impenda sobre o obreiro, resistindo à tentação de o procurar convencer a "dar um jeitinho". Quer se queira, quer não, a qualidade, o acerto ou a eficiência na execução da tarefa será sempre afetada. Ou então fica afetado o cabal desempenho ds obrigações enquanto Grande Oficial...  Pode a acumulação insensata eventualmente ser suportada, sem grande problema, durante algum tempo, com esforço acrescido do obreiro Grande Oficial. Mas, para além da injustiça que constitui a sobrecarga infligida ao obreiro, sempre se aumenta o risco de, mais tarde ou mais cedo, ele vir a falhar em algo que não falharia, não fosse essa sobrecarga.

No entanto, por muito importante que seja - e é! - a consideração da disponibilidade, a questão essencial respeita ao relacionamento entre a Loja e o seu obreiro Grande Oficial. Isto de ser Grande Oficial tem agarradas algumas implicações que propiciam desvios do correto relacionamento entre a Loja e o seu obreiro Grande Oficial. Afinal todos somos humanos e nenhum de nós é perfeito... O Grande Oficial usa um avental todo bonito, todo cheio de arrebiques e dourados (e também carote, diga-se em abono da verdade...). O Grande Oficial tem direito a tomar lugar no Oriente, ladeando o Venerável Mestre e, quando presente, o próprio Grão-Mestre. O Grande Oficial, naturalmente, é credor da cortesia de saudação específica. Tudo isso propicia a sensação de "importância", de "poder", de "autoridade", de diferença entre o Grande Oficial e os demais obreiros da Loja. Pode propiciar tudo isso, mas a Loja ou o Grande Oficial que porventura caírem numa dessas armadilhas estão a precisar de uma reciclagem sobre o seu entendimento do que é a Maçonaria e do que é ser maçom! 

A este respeito e para evitar dissabores e erros, é importante que a Loja e o Grande Oficial tenham sempre presentes dois princípios, que, sendo-o, por natureza são inegociáveis: (1) ser Oficial da Loja ou ser Grande Oficial, não é uma honra, é um serviço; (2) todos os maçons, desde o mais recente Aprendiz ao Grão-Mestre, passando por todos os obreiros que, com discrição, procuram cada dia ser um pouco melhores do que eram na véspera, são essencialmente iguais.

Ser Oficial de Loja ou ser Grande Oficial não é uma honra, não é um privilégio, não é um título. Ser Oficia de Loja ou ser Grande Oficial é, simplesmente, assegurar um ofício, uma tarefa. O Oficial de Loja não é comparável ao Capitão ou Major de uma Companhia ou Batalhão, Ser Grande Oficial não tem, em bom rigor, nada a ver com ser General de um Exército. O termo "Oficial" não tem nada a ver com nomenclatura militar. Em Maçonaria, Oficial é o que assegura um ofício, o que cumpre uma tarefa. Tão só!

Em Loja, todos, rigorosamente todos, são essencialmente iguais e como iguais são e só podem ser tratados. Eventuais deferências são devidas à função, não ao que a exerce. O Grande Oficial não tem nem mais um pingo de importância por o ser. É exatamente como era até ao momento em que começou a exercer o ofício e como será depois de o deixar de exercer. Não tem assim importância acrescida em relação aos demais obreiros. Continua a ser mais um entre todos e é assim que deve ser e que se deve sentir confortável. A sua palavra tem o mesmo peso que tinha antes de ser Grande Oficial, tem a mesma importância do que a de qualquer outro Mestre da Loja.

O obreiro pode ser Grande Oficial. Mas na sua Loja é apenas - e tanto é! - mais um igual entre iguais. Na sua Loja, o Grande Oficial pode usar um avental todo apinocado, pode sentar-se no Oriente, pode tudo isso. Mas continua a ser, a dever comportar-se e a ser tratado da única forma que faz sentido sê-lo na sua Loja: como um Irmão, mais um do grupo, mais um entre todos. E muito isso é! E sobretudo é o que interessa!

O obreiro pode ser Grande Oficial. Mas, antes de tudo, acima de tudo, mais importante do que tudo, continua a ser um obreiro da sua Loja.   

Rui Bandeira

03 abril 2017

Lição prática de Maçonaria


Um maçom português está na Alemanha. Outros maçons portugueses vão à Alemanha visitar uma Loja local. Tertulia-se. A conversa faz-se em torno de um tema cujo ponto de situação atual suscita dúvidas. Esse maçom português comunica por mensagem de correio eletrónico com um experiente e sabedor maçom residente no norte de Portugal. Por acaso, o tema em causa não é assunto em que o maçom residente no norte de Portugal seja especialmente versado. Para não dar uma resposta errada ou incompleta, remete a questão a outro maçom, também já com alguma experiência, que reside em Lisboa.

Por coincidência, esse maçom residente em Lisboa tinha recentemente ultimado um texto sobre o tema, que considerou que esclarecia as dúvidas suscitadas na teruliana conversa. Envia esse texto ao maçom do norte de Portugal. Por sua vez, o maçom do norte de Portugal envia o dito texto ao maçom que está na Alemanha, que por sua vez o circula pelos outros elementos que tiveram a tertuliana conversa onde surgiram as dúvidas.

Entretanto, o maçom do norte de Portugal acha que o tal texto pode ser interessante para outros maçons e, com a prévia anuência para tal do maçom de Lisboa, faz circular o dito texto pela sua lista de contactos maçons.

Sucede que, no tal texto, o maçom de Lisboa escrevia, a dado passo, que havia uma pequena parte do assunto que não podia melhor desenvolver, porque não lograra encontrar um documento essencial para tal.

Um dos maçons da lista de contactos do maçom do norte de Portugal, por fortuna, tinha a tradução em castelhano desse documento que o maçom de Lisboa não conseguira encontrar. Logo tomou a iniciativa de enviar essa tradução em castelhano para o maçom de Lisboa, que pode assim aperfeiçoar o seu escrito com o desenvolvimento que faltava.

Tudo isto se passou em não mais de 24 horas. De todos os intervenientes, o maçom residente em Lisboa apenas conhece pessoalmente o maçom que reside no norte de Portugal. Uma conversa gerou uma dúvida e, de uma normalíssima diligência para esclarecimento dessa dúvida, gerou-se, em muito pouco tempo, uma cadeia de eventos em que vários elementos se ajudaram a melhor esclarecer todos sobre o assunto em causa. Essa cadeia de eventos permitiu, designadamente, que aquele que ajudou acabasse, afinal, por ser também ajudado.

Materialmente, ninguém ganhou nada com isto - afinal, uma banal cadeia de eventos do quotidiano. Mas, no final, todo um conjunto de pesoas ficou a saber mais um pouco, designadamente em relação ao tema que gerou a dúvida.

A Fraternidade é isto. Permite que Irmãos que se encontram a centenas e milhares de quilómetros uns dos outros e que, na sua maior parte, nem sequer se conhecem pessoalmente, naturalmente cooperem entre si, se auxiliem e cada um aprenda um pouco com o que os demais lhe proporcionam.

Assim são os elos da cadeia de União que une os maçons, que funcionam para as pequenas coisas (como esta que descrevi) e possibilitam, quiçá, grandes realizações. Porque são as pequenas coisas que cimentam os alicerces das grandes edificações. Por isso a Maçonaria é uma Fraternidade que completa este ano trezentos anos, está bem e recomenda-se e prepara-se para os próximos trezentos. 

Rui Bandeira