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16 março 2007

À volta do Marquês

O nosso visitante O Profano, frequente autor de pertinentes comentários a textos publicados neste blogue, interroga-se, a propósito do texto de ontem:

Sempre ouvi dizer que o Marquês de Pombal teria sido iniciado na "Arte Real" aquando da sua estadia em Viena. Será essa informação que tenho, incorrecta?

A única resposta acertada para esta questão é: "Não sei!"

Efectivamente, como menciona o nosso comentador, é comum referir-se que o Marquês de Pombal teria sido iniciado maçon em Viena. No meu texto de ontem, consignei que "existem efectivamente indícios de que terá sido iniciado maçon. A época, as viagens, as ligações pessoais e o sentido de modernidade autorizam essa ideia" e aludi a um livro publicado por José Braga Gonçalves em que, de uma forma propositadamente romanceada mas indubitavelmente pormenorizada, se elencam alguns desses indícios.

Porém, a minha posição é que, com o que actualmente se sabe, apenas se pode dizer que é possível que o Marquês tenha sido maçon, mas não mais do que isso. Ou seja, existem importantes indícios... mas não há certeza!

Nesta questão da afirmação de quem foi o não maçon, sigo o critério de rigor que foi instituído pela Loja Quatuor Coronati, isto é, só dando como certo o que esteja indubitavelmente provado, seja por documentos, seja por declarações relevantes dos próprios, seja por testemunhos credíveis de maçons da época que com o visado tenham directamente privado.

No caso do Marquês, não se conhece inequívoca declaração sua de ter sido maçon - e tal não é de admirar: não nos esqueçamos que, naquela época, ainda funcionava em Portugal a "prestimosa" instituição que dava pelo nome de Santa Inquisição e que uma das suas tarefas era precisamente descobrir e aplicar o "santo correctivo" aos maçons...; aliás, é conhecido o caso do inglês de origem suíça John Coustos que, em 1743, fundou e dirigiu em Lisboa uma Loja Maçónica, tendo sido rapidamente preso e torturado, por nove vezes no espaço de dois meses, pelos Santos Inquisidores... Também, pela mesma razão, não se conhecem declarações de maçons da época que, tendo pessoalmente conhecido o Marquês, informassem da sua filiação na Ordem. Quanto a documentos, dificilmente se encontrará algo de relevante em Portugal, já que, devido às perseguições da Inquisição, a última coisa que os maçons de então, em Portugal, faziam era registar assuntos da Maçonaria em documentos, que poderiam facilmente cair nas mãos de algum denunciante ou, mesmo, de um Santo Inquisidor. Resta a hipótese de vir a ser localizado ou estudado algum documento austríaco, que venha a fornecer a prova inequívoca de que agora se não dispõe - e não sabemos se alguma vez dela se disporá.

É por isso que eu digo que é possível que o Marquês tenha sido maçon, iniciado em Viena - mas não afirmo que, com toda a certeza, o foi.

Ainda em comentário ao texto de ontem, "Fernando Pessoa" comentou que pensou que Aristides Sousa Mendes e Álvaro Cunhal tivessem tido alguma ligação à Maçonaria.

Quanto ao último, basta recordar que se afirmava ateu para se verificar que nunca poderia ter sido maçon regular; quanto à maçonaria liberal, lembremo-nos que postula ideais políticos e democráticos claramente incompatíveis com a ideologia assumidamente por ele professada e orgulhosamente defendida.

Quanto ao primeiro, recordemo-nos que era cônsul ao tempo da 2.ª Guerra Mundial e que, então, desde a entrada em vigor da lei de Salazar que proibiu as "associações secretas", já existia a regra de que todo o funcionário público, para o ser, tinha de emitir uma declaração por sua honra de que não era comunista nem membro de "sociedades secretas"; o meio diplomático de então era muito pequeno e, como hoje continua a ser, muito fechado; enquanto esteve na carreira, dificilmente poderia ter actividade maçónica sem ser detectado - e nada consta a esse respeito; depois de demitido e perseguido pelo regime de Salazar, tendo uma família numerosa para sustentar, teve de dedicar a sua vida à luta pela subsistência tão digna quanto possível; as coisas do espírito e do aperfeiçoamento pessoal não fizeram então, certamente, parte das suas preocupações prioritárias... Mas reafirmo que qualquer maçon se sentiria honrado em poder tratá-lo por Irmão e que, indubitavelmente, pode e deve ser reconhecido como um "maçon sem avental".

Rui Bandeira