26 dezembro 2016

Os Valores vencerão os medos e o terror


Quis o calendário deste ano que este texto se publique a 26 de dezembro, logo após o feriado do Natal. Espero que todos os que o leem tenham tido umas Boas Festas, em paz, sossego e junto de sua família, se assim foi o seu desejo.

Quer o calendário e a programação deste blogue que o próximo texto que convosco partilhe seja publicado já no início da segunda semana de janeiro de 2017, quando os festejos da Passagem de Ano já mais não forem do que recordação.

Esta é altura de balanço do ano que está prestes a findar e de expectativa em relação ao ano que aí vem. Abalanço-me ao balanço e à expectativa.

Vivemos tempos complicados e que nos impõem a necessidade de serenidade nas análises que fazemos.

O ano que finda não foi, seguramente, dos melhores anos da nossa vida coletiva. Em termos económicos, em Portugal começou-se a ver um ainda muito leve, e esperemos que não tão frágil como alguns o pintam, desanuviamento. Mas no Brasil a coisa parece estar feia e a instabilidade política e a desconfiança que se adensa sobre muitos dos atores políticos não vai ajudar nada. Receio que no País-Continente a situação vá piorar antes de melhorar... Desejo que piore pouco e por pouco tempo e que melhore muito e consistentemente. Nos demais países lusófonos, alguns vivem tempos de dificuldade, outros procuram diminuir as dificuldades que vêm de trás. Que paulatinamente todo o espaço que compartilha a nossa língua consiga evoluir, melhorar e, sobretudo, manter-se em Paz!

A nível global, o ano prestes a findar foi um tempo de crescimento da insegurança, da prática de atrocidades, de crescimento de nacionalismos e paroquialismos, de retrocesso da racionalidade e de cedência ao medo irracional, à fúria destemperada, à recusa do outro que é diferente, que só pode preocupar quem acredita que o Homem é mais do que bicho e instintos. Atentados, xenofobia. regresso de nacionalismos retrógados e, sobretudo, muito perigosos, populismos aproveitando-se dos medos de gentes desorientadas, senhores do mundo e de guerra em braços-de-ferro cujas consequências não recaem (nunca recaem...) sobre eles, mas sobre uma amálgama de pobre, desprezada e indefesa gente que, no mínimo, passa à condição de refugiada, no máximo perde a vida e no meio sofre um horroroso cortejo de violências, fome, estropiações e barbaridades, a tudo isso assistimos durante este ano e, pior, não temos razões para ser otimistas e antecipar que deixaremos de assistir no próximo ano.

Vivemos tempos difíceis, de medo, de insegurança, de misérias, mas também de egoísmos, demagogias e fundamentalismos.

A luta pelas armas e pelas medidas policiais e judiciais contra os fundamentalismos e suas expressões de terror é necessária, mas é insuficiente. 

O Mundo vive hoje uma guerra que é diferente das que anteriormente houve. Agora já não se trata de embates de exércitos clássicos, nem sequer de guerrilhas em busca da erosão de poderes confiando no apoio de populações. Agora assiste-se à tentativa de estabelecimento, por qualquer meio, de uma conceção fundamentalista de vida, utilizando o terror para tentar quebrar quem é diferente, com o fito de o sujeitar ao modo de vida que julgam dever ser o único com direito a existir. 

Essa guerra tem, obviamente, de ser combatida pela força das armas e da imposição das normas de sã convivência social, mas só pode ser ganha com a vitória das ideias de Liberdade, de Democracia, de Respeito pelas Identidades de Todos sobre a estreita e mesquinha mentalidade de quem se acha o detentor da única verdade admissível.

Não é cedendo a medos e endossando populismos que vamos lá. Não é fechando fronteiras que obtemos segurança. Não é rejeitando os outros por serem diferentes de nós e parecidos com a matilha fundamentalista, mas também dela vítimas, e quantas vezes mais direta, grave e profundamente vítimas dos raivosos de pensamento único, que extirpamos o cancro que ataca o corpo da nossa sociedade global.

Temos de ter a sensatez e a força de compreender que religião não tem nada a ver com fundamentalismo terrorista, designadamente que muitos muçulmanos sofrem também ataques ferozes por parte de pretensos guardiães das pretensas purezas de uma fé que distorcem, enfim que distinguir a religião islâmica da caricatura nojenta que dela fazem os que usam o terror e o fundamentalismo para desvirtuar o que é uma crença tão respeitável como as demais.

Deus, Jeovah, Allah, são apenas designações diveras do mesmo e único Criador. É estúpido - sobretudo profundamnete estúpido! - que se trucidem pessoas apenas em função e em nome de uma alegada pureza e superioridade de que se arrogam uns quantos - afinal seres de vistas curtas e horizontes muitíssimo limitados! - que não só se arrogam detentores de pretensa verdade absoluta como buscam impô-la pela força e pelo terror a quem dessa pretensa verdade absoluta se desvie um milímetro que seja.

A longo prazo, a vitória sobre estes ignorantes e canhestros fundamentalistas obter-se-á, não pela rejeição ou medo do diferente, mas pela inclusão e diálogo aberto entre os diferentes, inclusão e diálogo que inevitavelmente mostrarão a todos que, afinal, os aparentemente diferentes são essencialmente iguais! Essa será a forma como isolaremos os tumores e os extirparemos do seio da Humanidade! 

Há umas centenas de anos, a Europa dilacerava-se em nome de diferentes conceções religiosas. Um espaço houve onde se podiam juntar todos os que tinham diferentes conceções, desde que de boa vontade, coração puro e espírito de fraternidade para o seu semelhante. Foram as Lojas maçónicas. Aí germinaram as sementes da Tolerância, da Liberdade, da Igualdade, da Fraternidade, do Respeito pelos Direitos Humanos, que conduzirama Humanidade a tempos de Paz e de Progresso.

Hoje, perante a ameaça de fundamentalismos, de extremismos, de populismos, a Maçonaria continua a ser um espaço de diálogo, de fraternidade, de debate entre iguais, ainda que aparentemente diferentes. Aqui se continuam a deitar as sementes, e a cuidar para que germinem e cresçam, da Tolerância, da Paz e da Concórdia.

À bruta força dos extremismos, a Maçonaria contrapõe a Sabedoria, a sã Força e a Beleza das ideias da Tolerância, da Liberdade, da Igualdade, da Fraternidade, do Respeito pelos Direitos Humanos. A Maçonaria, as suas Lojas, os seus debates serenos, a sua Fraternidade, estão na linha de combate ao obscurantismo. E, no final, serão os nossos Valores que vencerão. Porque são as ideias que vencem o terror!

Rui Bandeira 

19 dezembro 2016

"Prancha de Traçar"


O texto que hoje publico viu a sua "luz" aqui à algum tempo atrás e quero partilhá-lo também com os habituais leitores e visitantes do  "A Partir Pedra", e trata de um tema que faz parte da vivência e prática maçónica, e que são as "Pranchas"...

Uma “Prancha de Traçar”, ou “Prancha Traçada” como também é costume se designar, pois é o resultado final que é avaliado, não é mais do que um trabalho efetuado por um maçom. Independentemente do material do qual é elaborado ou tema abordado, ela é sempre de extrema relevância no processo de aprendizagem e formação do maçom bem como no seu trajeto pelos vários graus do rito que pratique.

  O facto de se designarem por Pranchas de Traçar, os trabalhos apresentados em Loja e executados por Maçons, é originário da Maçonaria Operativa, a maçonaria dos artífices pedreiros da época da Idade Média.

Era nas suas pranchas que eles desenhavam as plantas dos imóveis, criavam os seus projetos de construção e montavam a maqueta da construção a realizar. Algo que nos dias de hoje, é efetuado pela classe dos arquitetos (provindo dessa classe outra designação pela qual também é conhecida a prancha de traçar, a “Peça de Arquitetura”).

 É através da execução de pranchas que o maçom toma um maior contato com a vasta simbologia maçónica e a interpreta à sua própria maneira. Ele nas suas pranchas, emprega o seu cunho pessoal e a sua noção sobre os vários assuntos ou temas maçónicos em análise.

Qualquer assunto é passível de ser traçado numa prancha, devendo apenas o mesmo ser executado através de um método de estudo e pesquisa sobre o tema, de forma a completar ou inovar o que já existe sobre a matéria em análise, ou se possível, criar algo novo que ainda não exista comentado ou feito, nomeadamente no caso de pranchas em que a pintura ou a música são a temática central.

  Todas as pranchas são passíveis de serem comentadas, apesar de ser costumeiro se afirmar que “prancha de Mestre não se comenta”, as críticas e comentários existem à mesma, nem que seja para assertivar ou elogiar o Irmão que a executou para além do tema que serviu de base à construção da prancha. Já em relação às pranchas dos Aprendizes e Companheiros, essas recebem as críticas necessárias à formação dos mesmos, na medida em que tal seja necessário.

  E tal como a construção mais simples é fruto de uma intensa pesquisa e enorme trabalho no seu desenvolvimento, também as pranchas dos pedreiros, agora “livres”, são executadas com o mesmo sentido de responsabilidade e labor. Sendo que a prancha a realizar, independentemente do seu tema, dever acima de tudo conter as três grandes qualidades maçónicas, “Força, Sabedoria e Beleza”.

“Força”, porque deve ser forte o suficiente para ficar impregnada na alma do maçom; “Sabedoria”, porque uma prancha deve conter informação relevante que ensine os demais; e “Beleza”, porque neste mundo nada pode ser forte e sapiente, se não encerrar em si algo de belo.

  Agora se esta prancha que eu “tracei” engloba as qualidades maçónicas, só os leitores o poderão afirmar… 

12 dezembro 2016

Valores Maçónicos (II)


O segundo tema dos Antigos Deveres respeita ao relacionamento que o maçom deve ter com o Poder Político e respectivas autoridades.

Eis o seu teor:

Um Maçon é sempre um súbdito pacífico, respeitador do poder civil, em qualquer lugar que resida ou trabalhe. Jamais está implicado em conspirações ou conluios contra a paz e a felicidade da nação, nem se há-de rebelar contra a autoridade, porque a guerra, os derramamentos de sangue e as perturbações, têm sido sempre funestas à Maçonaria. Assim, os antigos Reis e Príncipes sempre estiveram dispostos a proteger os membros da corporação posto que sua tranquilidade e fidelidade, que refutavam praticamente as calúnias de seus adversários, realçavam a Honra da Fraternidade, que sempre prosperou em tempos de paz. De modo que, se um Irmão se rebelasse contra o Estado, não deveria ser sustentado em seus atos. Todavia, poderia ser confortado, como um infeliz, e se não for reconhecido culpado de nenhum outro crime, embora a fiel Confraria deva desaprovar sua rebelião para não dar ao governo motivo de descontentamento e para evitar que alimente suspeitas, não se pode excluí-lo da Loja, suas relações com ela permanecendo invioláveis.

Deste texto retira-se que o maçom deve seguir o Valor do Respeito da Legalidade, que implica a recusa de atividade revolucionária ou o uso de violência para alteração de regime político. É, no fundo, o princípio essencial da Democracia. A sociedade organiza-se segundo normas que devem ser respeitadas. A alteração dessas normas deve efetuar-se pelas formas previstas na legalidade vigente. A mudança de responsáveis políticos deve ocorrer no respeito da legalidade e sempre por via pacífica e democrática.

Também aqui estão presentes os Valores da Fraternidade, da Tolerância e, bem vistas as coisas, da Igualdade e da Liberdade.

Mesmo perante o erro, que deve ser desaprovado, deve permanecer a inviolabilidade dos laços entre maçons.

A Fraternidade não implica auxílio na infração ou injusta vantagem concedida a quem quer que seja. Mas implica, perante a desgraça. o auxílio, perante o erro, o auxílio na sua superação.

Pressuposto da Fraternidade é a Tolerância (que não se confunde com permissividade), a aceitação de que o outro tem o direito de pensar e agir de forma diferente da minha maneira de pensar e de agir, sem, por isso, perder a meu respeito e a minha consideração pela sua individualidade. Posso e devo discordar de pensamentos com que não me identifico - mas não posso deixar de respeitar o direito do outro de pensar diferentemente de mim. Posso e devo verberar e condenar a ação errada, mas não devo ostracizar quem errou, antes cumpre-me auxiliar a que quem errou se corrija. Devo reconhecer que, tal como o outro erra no seu pensamento ou na sua ação, também eu estou sujeito a errar no meu pensamento e na minha ação. Devo, portanto, tolerar sem rebuço entendimento diverso do meu que considero errado, até porque, no limite, só a realidade e o futuro demonstrarão se o pensamento errado era o do outro ou o meu…

Subjacente à Fraternidade e à Tolerância está a Igualdade. Todos somos iguais na essência, embora todos sejamos diferentes, porque cada um de nós é único. Cumpre-nos, assim, reconhecer a Igualdade essencial do outro, imanente na sua diferença pessoal. Mais. só porque somos todos essencialmente iguais é que nos logramos realizar individualmente nas nossas diferentes especificidades. Daí , dessa Igualdade essencial, inevitavelmente que resulta a nossa necessidade de Tolerância das diferenças imanentes às diversas individualidades e a Fraternidade que nos deve unir aos nossos essencialmente iguais que, afinal, são todos os demais.

Tudo isto, em última instância, deriva da Liberdade de que o Criador nos dotou. O livre arbítrio é caraterística intrínseca do Homem e só existe na medida em que exista a Liberdade para cada um se determinar.

O Criador arquitetou o Universo concedendo a estas criaturas o Livre Arbítrio, para que o exerçam em Liberdade, reconhecendo que todos estão em plano de Igualdade essencial, nas suas diferenças individuais, que devem ser, assim Toleradas, devendo todos manter um relacionamento Fraterno.

Os demais Antigos Deveres, genericamente, repetem a necessidade destes Valores havendo apenas que realçar, de novo, quanto à Conduta que devem adotar os maçons, a referência aos Valores do Respeito (Não organizareis comissões privadas nem conversações separadas sem permissão do mestre, nem falareis de coisas impertinentes nem indecorosas, nem interrompereis o mestre nem os vigilantes nem qualquer irmão que fale com o mestre; nem vos comportarei jocosamente nem apalhaçadamente enquanto a loja estiver ocupada com assuntos sérios e solenes; nem usareis de linguagem indecente sob qualquer pretexto que seja; mas antes manifestareis o respeito devido aos vossos mestre, vigilantes e companheiros e venerá-los-eis.), da Temperança (Podeis divertir-vos com alegria inocente, convivendo uns com os outros segundo as vossas possibilidades. Evitai porém todos os excessos…), da Cortesia (Deveis cumprimentar-vos uns aos outros de maneira cortês…) e da Prudência (Sereis prudentes nas vossas palavras e atitudes…).

Respeito, Temperança, Cortesia e Prudência são Valores sociais que os maçons adotam também como essenciais na sua conduta.

Em suma, os Valores maçónicos são a expressão dos Valores Sociais adotados pelos maçons, com especial grau de exigência para si próprios. A contínua e intransigente prática destes Valores conduz o maçom ao seu desejado aperfeiçoamento pessoal, moral e espiritual. Os Valores maçónicos são assim o meio, o caminho e as ferramentas para o maçom levar a cabo a sua construção de si.

Rui Bandeira

05 dezembro 2016

"Tronco da Viúva"...

Hoje publico um texto de minha autoria e que foi publicado anteriormente aqui, cujo o tema é o "Tronco da Viúva". Termo este um pouco estranho para quem pouco ou nada sabe sobre a Maçonaria mas que não deixa de ter um cariz muito importante dentro da Ordem.
Desta forma, passo ao texto em si:

"Tronco da Viúva

 O “Tronco da Viúva” é também designado por “Tronco da Beneficência” ou “Tronco da Solidariedade”.
 Ao Tronco da Viúva são lhe atribuídas várias origens, pelo que uma das mais assumidas pela Maçonaria tem origem bíblica.
Hiram Abiff, mestre construtor do Templo de Salomão era filho de uma viúva. Mestre esse, que foi assassinado por três companheiros seus, por não querer divulgar os segredos de construção a que estava sujeito como mestre-de-obras. Esse assassinato veio mais tarde a originar uma das mais importantes lendas da Maçonaria; a qual está na base da maioria dos ritos maçónicos atuais. Advindo dessa lenda, o epíteto de “Filhos da Viúva”, com que se costumam designar os Maçons.

O facto de se designar por “tronco”, deve-se ao facto dos trabalhadores afectos à construção do Templo de Salomão, os Aprendizes e Companheiros, receberem os seus salários ao final do dia, junto às colunas do Templo. Para além de que etimologicamente, “caixa de esmolas” na língua francesa também se designar por “tronc”.
Sendo que o termo “Tronco da Viúva”, simboliza também uma (caixa de) esmola para socorro e auxílio das esposas (e filhos menores) de Irmãos falecidos.

Em Loja é o Mestre Hospitaleiro que está encarregado de fazer circular o Tronco da Viúva. Tronco esse, que em dado momento litúrgico de uma sessão maçónica, circula pelos Irmãos para que possam efetuar o seu óbolo na medida em que tal lhes seja possível.

Cabe ao Mestre Hospitaleiro e ao Mestre Tesoureiro, cuidarem para que ele se encontre numa situação-equilíbrio para que se possa prestar o auxílio necessário a quem dele reclamar. E como tal, o Tronco da Viúva não se quer nem muito cheio nem muito vazio. Se o mesmo se encontrar vazio, é porque as doações não serão significativas, correndo-se o risco, de se não se auxiliar quem dele necessitar numa situação imediata. Mas se ele se encontrar cheio, é porque quem necessitar de auxílio, não o estará a receber na devida forma.

Sendo que um dos deveres do Mestre Hospitaleiro é o de bem aconselhar o Venerável Mestre sobre os fins a darem às importâncias obtidas na circulação do Tronco da Viúva em Loja. A quem ou a quais, sejam Irmãos ou Instituições Sociais de que os necessitem.

Essa também é uma das funções sociais da Maçonaria. Ajudar outras instituições carenciadas que necessitem de auxílio; não procurando o Maçon o reconhecimento de tais atos, pois a soberba não deve existir nas suas ações. O Maçon assim faz, porque simplesmente acha de que o deve fazer, não porque procura méritos ou benefícios com isso. 
Sendo que, por não se procurar reconhecimentos ou assumir falsos méritos, é que a caridade maçónica sob a forma de tronco, é feita de forma reservada, nunca devendo um Maçon mostrar o que deposita no Tronco da Viúva. 
Quem procurar reconhecimento, deve procurar outro sítio para fazer a sua solidariedade, a sua caridade.

O Tronco em si mesmo, é uma forma de Solidariedade, ele lembra ao Maçon, que a beneficência e a solidariedade devem estar presentes ao longo da sua vida, fazendo ambos parte dos deveres do Maçon. Além de que, na circulação do Tronco da Viúva em Loja se relembrar ao Maçon que ele deve ser generoso e caritativo. Por isso, quando um Maçon faz o seu óbolo, ele deve dar um pouco de si também. Mas nunca com o pensamento de que um dia se necessitar, terá algo a que se “agarrar”. O Tronco da Viúva não serve de ”almofada” para os Maçons. Não devendo eles se aproveitarem da sua existência, para mais tarde o utilizarem sem razão aparente.

Quando um Maçon faz a sua entrega, a sua dádiva para o Tronco da Viúva, a única coisa que deve ter em mente, é o de partilhar um pouco de si mesmo e do que tem com os demais Irmãos.

Mas apesar de não ser uma obrigação principal da Maçonaria, pois a mesma não é uma IPSS, cabe ao Maçon ter um espírito solidário com quem dele necessite. Por isso mesmo, a missão do Tronco da Viúva, é a de ajudar um Irmão que necessite de auxílio.
Mas para alguém puder ser ajudado, é também necessário que o Irmão em causa reconheça a sua necessidade de auxílio. Mas, nem sempre quem precisa de ajuda, o solicita. A vergonha ou inclusive o orgulho, são em grande parte dos casos, o “travão” pessoal à procura de auxílio. Quem precisa de ajuda, deve por para “trás das costas” tais sentimentos, pois agindo assim, corre o sério risco de perder toda a ajuda que necessitar. E hoje em dia, devido à forma acelerada de como vivemos as nossas vidas, nem sempre nos é possível perceber quem necessita da nossa ajuda.

Todos nós em certas alturas da Vida, passamos por momentos em que fraquejamos ou que a nossa força mental não nos consegue ajudar a suportar o dia-a-dia.
 É principalmente nesses casos que o Maçon deve ajudar os seus Irmãos. Tentando se aperceber com a sua iluminação, quem necessita mais dele. Mas essa ajuda nem sempre deve ser (ou pode ser…) financeira mas antes moral ou espiritual, pois nem todas as carências de um Irmão são pecuniárias ou materiais. Muitas vezes apenas alguém necessita de uma palavra de inspiração, uma “palmada nas costas” ou um simples gesto de afeto e carinho. Tais gestos com certeza não podem ser depositados num saco, devem-no antes ser entregues (pessoalmente) ao Irmão necessitado. 
É amparando o seu Irmão, que o Maçon lhe demonstra a sua solidariedade e vive o espírito de fraternidade que a Maçonaria lhe oferece.

 Tal como afirmei anteriormente, a Maçonaria não é uma IPSS. Antes é uma Instituição que promove a Solidariedade, a Beneficência, a Fraternidade. E como tal, a sua principal missão é ser solidária com os seus membros/Irmãos. 
Sendo assim, não deve uma Loja virar as costas a um Irmão que esteja em apuros, devendo antes, correr em seu auxílio e o amparar na resolução dos seus problemas. E é para isso que fundamentalmente existe o Tronco da Viúva.
A única obrigação que ele tem, é a de ser bem utilizado!".
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28 novembro 2016

Valores maçónicos (I)


Uma forma de determinarmos quais são os Valores maçónicos é verificar quais são os que encontramos referidos nos textos constitutivos e nos textos essenciais da Maçonaria.

Nas Constituições de Anderson de 1723, encontramos a compilação dos Ancient Charges, os Antigos Deveres. Lendo-a, deparamos com um significativo conjunto de Valores, que integram o cerne do que podemos considerar como a ideologia maçónica.

O primeiro capítulo dos Antigos Deveres trata de Deus e da Religião e nele pode ler-se:

Um Maçom é obrigado, pela sua condição, a obedecer à lei moral. E, se compreende corretamente a Arte, nunca será um ateu estúpido nem um libertino irreligioso. Mas, embora, nos tempos antigos, os maçons fossem obrigados, em cada país, a ser da religião desse país ou nação, qualquer que ela fosse, julga-se agora mais adequado obrigá-los apenas àquela religião na qual todos os homens concordam, deixando a cada um as suas convicções próprias: isto é, a serem homens bons e leais ou homens honrados e honestos, quaisquer que sejam as denominações ou crenças que os possam distinguir. Por consequência, a Maçonaria converte-se no Centro de União e no meio de conciliar uma amizade verdadeira entre pessoas que poderiam permanecer sempre distanciadas.

Deste texto resulta que um primeiro Valor a ser respeitado é o da Crença num Princípio Criador.

O Antigo Dever é claro ao estipular que um maçom nunca será um “ateu estúpido”, mas também que está apenas obrigado “àquela religião na qual todos os homens concordam, deixando a cada um as suas convicções próprias”.

Daqui resulta um segundo Valor a ser respeitado: a Liberdade de Crença Religiosa.

Um maçom deve ser crente, mas a natureza e os termos da sua crença só a ele dizem respeito e ninguém tem nada com isso.

Da conjugação destes dois Valores resulta que a Maçonaria respeita e considera todas as religiões, todas admitindo e a nenhuma concedendo especial privilégio. Paradoxalmente - ou talvez nem por isso… - esta posição da Maçonaria enquanto instituição de nenhuma crença religiosa privilegiar ou condenar, deixando o juízo concreto sobre o tema a cada um dos seus elementos, criou um ponto de conflito com algumas hierarquias religiosas (Igreja Católica, várias Igrejas Evangélicas, várias tendências do Islão), porquanto colide com o cerne de várias religiões, assente na consideração de que a Salvação tem como pressuposto a crença segundo a sua particular religião.  

Mas este Valor da Liberdade de Crença Religiosa vai mais além do que a igual aceitação das várias religiões organizadas. Admite e aceita que cada um siga  a sua convicção própria, integrando-se esta ou não numa religião organizada. Admite-se assim que seja maçom o deísta, o panteísta e mesmo o budista (cuja crença não inclui um Deus, mas indubitavelmente assenta num Princípio Criador, ao qual eventualmente o ser logrará fundir-se, atingindo o Nirvana).

De fora ficam apenas os ateus e os agnósticos, aqueles rejeitando a existência de Divindade, estes não crendo nem deixando de crer.

Mas clamam muitos que a Liberdade de Crença Religiosa inclui a Liberdade de crer, mas também a de não crer, ou de não saber se deve crer ou não. É o caso daqueles que integram a dita maçonaria Irregular ou Liberal.

Este argumento permite alertar para uma distinção, que se afigura necessária, entre Valores Sociais e Valores Maçónicos. Os Valores Sociais são aqueles que devem ser prosseguidos e exigíveis na sociedade humana. Os Valores Maçónicos são mais exigentes do que estes, na vertente do seu prosseguimento pelos próprios maçons.

Não há dúvida de que, enquanto Valor Social, a Liberdade de Crença Religiosa compreende, a liberdade de crer ou descrer e nenhum cidadão pode ser prejudicado ou beneficiado em virtude de professar uma religião, seguir uma crença, ser agnóstico ou ateu. Mas o conceito de Valores Maçónicos implica a consideração dos preceitos ou princípios que os maçons seguem na sua própria ação. Assim sendo, o maçom respeita e considera o ateu e o agnóstico enquanto elementos sociais válidos que, e bem, usam a sua liberdade de pensamento e de escolha, quanto à orientação religiosa. Mas exigem de si próprios e a si próprios que acreditem no Criador, qualquer que seja a sua particular conceção Dele, sigam ou não os preceitos de uma religião organizada. Quem for agnóstico ou ateu, não há qualquer razão para não ser um válido elemento da sociedade, deve reconhecer-lhe o direito de o ser e de não ser, por qualquer forma, prejudicado pela sua maneira de pensar, é de pleno direito um elemento integrante da Sociedade, no uso do Valor Social da Liberdade de Crença Religiosa, tal como deve ser entendida na sociedade, mas não é maçom, porque esta qualidade pressupõe necessariamente a crença no Criador.

Devemos assim estar atentos a que uma expressão pode ter significados diferentes, consoante se aplique à sociedade em que nos inserimos ou se aplique à mais restrita comunidade dos maçons. Só assim, aliás, faz sentido qualificar o conceito de Valores com o adjetivo maçónicos. Se os Valores Maçónicos fossem integralmente coincidentes com os Valores Sociais, não era necessária a adjetivação: utilizava-se simplesmente a denominação de Valores. O que nos permite a conclusão de que os Valores Maçónicos são os preceitos morais que os maçons utilizam para orientar a sua própria atuação e que são ou coincidentes ou mais exigentes que os Valores em uso na Sociedade.

Um terceiro Valor ínsito neste capítulo é o da Bondade. O maçom deve determinar a sua conduta no sentido de fazer e espalhar o Bem, criar, na medida do que lhe for possível, a felicidade à sua volta. Tratar bem todos aqueles com quem interage, facilitar a vida ao próximo, e não dificultá-la, deve ser apanágio do maçom.

Um quarto Valor descortinável neste capítulo é o da Lealdade. Ser leal para com os seus Irmãos, os seus colegas ou superiores no trabalho, a sua família e amigos é um requisito obrigatório para um maçom. Quem é desleal não é digno da confiança alheia, não é uma pessoa de bons costumes.

Os quinto e sexto Valores que surpreendemos neste capítulo são a Honradez e a Honestidade. Não são conceitos sinónimos. Entre eles existe uma relação de género e espécie. Todo o homem honrado é, necessariamente, honesto, mas nem todos os homens honestos são honrados.

A Honestidade afere-se relativamente à postura quanto a bens materiais e relação interpessoal. O homem honesto quer para si, recebe e apropria-se daquilo a que tem direito e entrega aos outros aquilo a que eles direito têm. Não prejudica ninguém. Cumpre a sua palavra. Pratica a verdade e recusa a mentira. Mas não tem a obrigação de se prejudicar em prol de compromissos que não tenha assumido ou em situações que não são de sua responsabilidade.

O homem honrado também tem essa postura, mas vai mais além. Honra implica sentimento do dever, da dignidade e da justiça. O homem honrado cumpre o que considera ser seu dever, o que acha deve ser digno de si, o que acha justo, mesmo que não tenha obrigação disso, mesmo que não tenha assumido ou prometido agir dessa forma. Vai além da mera honestidade. Se necessário, prejudica-se em prol da dignidade, própria ou alheia, ou da justiça.

Rui Bandeira

21 novembro 2016

“Estar Aprendiz…”





Para a publicação de hoje trago-Vos uma Prancha lida em Loja há algum tempo atrás, aliás foi a minha primeira Prancha escrita e posteriormente lida numa Sessão Maçónica, logo uma Prancha de Aprendiz.
Geralmente as Pranchas deste Grau são muito pessoais, sensoriais. Normalmente são abordadas as "primeiras impressões" de quem chega a uma Loja e não raramente são abordadas as Iniciações ou o simbolismo do que se pode observar e tocar num Templo Maçónico. 
Naturalmente também pouco mais se pode pedir a um Aprendiz. Ele é uma "pessoa nova", recém-chegada a um grupo já coeso e unido e terá de se integrar - e ser integrado (!) - e uma das melhoras formas desta "integração" é a sua formação.
- Apenas bem formando poderemos ter melhores maçons, melhores Homens entre nós e na Sociedade.-

E como numa sessão o Aprendiz nada diz, apenas observa,  poderá então fazer uma "viagem interna", um pouco semelhante à viagem que teve de fazer na sua Iniciação. Este facto de ter de estar obrigatoriamente em silêncio durante a sessão, vai lhe permitir fazer uma reflexão introspetiva e uma contemplação de tudo o que vê e ouve que, eventualmente, de outra forma não poderia ser feita, principalmente por alguém que pouco ou nada sabe sobre Maçonaria. No fundo, serve de uma proteção ao próprio também, porque desta forma não poderá errar e lhe são corrigidos eventuais comportamentos intempestivos que poderiam prejudicar o "normal" funcionamento da Loja.

E como Aprendiz, o que a Loja espera do seu trabalho é fundamentalmente a sua integração, a correção de comportamentos profanos errados/desviantes que possa ter e apreender o simbolismo que lhe é apresentado e a Ordem em si. O que não é tão pouco ou tão simples como o possa aparentar.

Dito isto, passo à transcrição da Prancha que Vos trago, a minha "primeira Prancha" e cujo título é "Estar Aprendiz":

"Estar Aprendiz"
                                  Muito Respeitável Grão-Mestre,
Venerável Mestre,
Respeitáveis Oficiais desta Assembleia de Maçons,
Ilustres Irmãos em todos os vossos Graus e Qualidades…

À Glória do Grande Arquiteto do Universo!

 Pois é, aqui estou eu entre colunas, de “Pé e à Ordem” defronte a Vós, aproveitando este pequeno interstício do meu tempo de silêncio na Coluna do Norte,  para Vos oferecer esta  Prancha cujo tema é Estar Aprendiz…”.
Após demorado período de introspeção e reflexão, eu ansiava por buscar a “Luz”. O Conhecimento!
O que já detinha não me chegava e eu ambicionava mais…
As leituras, as pesquisas que efetuava sobre a Arte Real, os vídeos e documentários que visionava, apenas me aumentavam os meus conhecimentos sobre a Maçonaria. Cada vez que pesquisava, mais me “aguçava” o espírito.
Mas, por mais que lesse e estudasse, sentia que faltava sempre “qualquer coisa”.

A Maçonaria faz-se, vivenciando-a!

E como “quem procura, acaba por encontrar”, decidi “bater à Vossa porta”. A porta deste honrado Templo onde reinam a Tolerância, a Virtude e  a Liberdade.

 Entretanto prossegui o meu caminho, pessoal mas não solitário, através do setentrião, escutando, meditando e refletindo sobre tudo o que se tratava e discutia em Loja como também sobre o vasto simbolismo inerente ao grau em que me encontro. Não foi fácil e nunca o será. Trabalhar para aprender assim o implica!!!
Por isso demorei algum tempo a escrever esta minha primeira prancha que tenho hoje a honra de a partilhar com Vocês.
Para alguns, talvez tenha demorado tempo demais na sua elaboração, certamente pouco tempo para outros, mas tempo em Maçonaria é um conceito que não encontra paralelismo na profanidade. E como tal, aqui me encontro e me apresento diante Vós como um simples aprendiz, e cá estarei sempre para Vos ouvir e refletir no que tendes para comigo partilhar e principalmente me ensinar. E, com o Vosso honrado auxílio seguirei em frente neste percurso que é a Vida. Pois se a Vida não pára, a aprendizagem também não…
Aprendiz ontém, hoje e sempre!!!

 Prosseguindo, o Aprendiz, recém neófito, ao entrar numa loja maçónica vai encontrar gente de várias idades, vários quadrantes sociais e politicos, pelo que lhe é exigido tolerância em relação às opiniões e posturas dos respetivos irmãos. Ele só terá a aprender com eles no imediato, para que lhes possa ensinar no futuro.
O aprendiz deve aprender a executar o ritual de forma exemplar, por forma a que interiorize a ritualística necessária ao bom funcionamento da Loja. Aprender os timings em que as “coisas” acontecem e são feitas.
  A atenção é fundamental no seu processo de formação, tal como o era na escola, tal como o é no seu emprego. Sem se estar concentrado no que se faz e que se aprende, o erro sucederá; neste caso, a distração será tal como o “rápido” é inimigo do “bom”.

 No entanto, não basta ao Aprendiz querer aprender, ele tem de ter vontade em mudar e mudar para melhor. Vendo, ouvindo e refletindo, o Aprendiz irá por em prática o seu aprendizado e irá interiorizar e compreender os vários conceitos e a vasta simbólica maçónica que encontrará no seu grau. O que oportunamente lhe criarão a disciplina de estudo que o auxiliará na sua caminhada pela Augusta Ordem a que todos temos a honra de pertencer.

 Todavia, é no grau de Aprendiz que a consciencialização pessoal terá um potencial maior. Isto é, fruto do silêncio a que o Aprendiz é submetido, o Aprendiz irá utilizar faculdades interiores que lhe seriam desconhecidas. E a meditação será uma delas, pois através do seu silêncio, lhe será muito dificil de errar, mas não impossível de o fazer. Porque para se aprender, também por vezes é-se necessário cair no erro.
E uma das melhores lições que a Vida nos pode proporcionar é qual a atitude a ter e quais os procedimentos a efetuar para se evitar esse mesmo erro numa ocasião futura.

Não adianta querermos exaltar as nossas virtudes se depois não quisermos evitar o erro, combatendo os nossos vícios e as nossas  paixões!
E como poderemos ambicionar sermos justos e perfeitos, se os nossos erros persistirem?! E nada aprendermos com eles?!

 Não é à toa que um dos métodos que uso na minha aprendizagem maçónica foi adquirido através do “silêncio”.
De modo que algumas das mais-valias desse silêncio são aprender, ouvir e escutar de uma forma que se assim não o fosse, influenciaria negativamente a minha aprendizagem.
Sendo esse também um dos motivos pelos quais o Aprendiz tem o dever de permanecer calado em sessão de Loja, que é para que aprenda e acima de tudo, discipline a sua vontade de falar. E assim falar somente o necessário, quando necessário, e de uma forma sucinta, apenas o que for importante para conhecimento dos demais Irmãos.

 É através do silêncio, tal como a citação latina “Audi, Vide, Tace” o demonstra (ver, ouvir, sentir/calar), é que a reflexão é posta em prática, fazendo-se de forma demorada e paciente a análise do que se tem a aprender e principalmente do que se tem para dizer. Tanto que apenas permanecendo em silêncio se é passível de atingir um estado de clarividência, um estado de consciencialização que trará benefícios espirituais ao próprio Ser.

  E, reconhecendo o valor do silêncio nos dias que correm, onde toda a gente parece mais preocupada em se fazer ouvir, do que ouvir alguém; é de elevada importância, e por isso eu sinto-me grato pelo tempo em que tive e ainda tenho de permanecer em silêncio.

 Estar Aprendiz, também é partilhar. Seja através da partilha de informação ou de conhecimentos adquiridos pela experiência de uma vida, seja através de ensinamentos sobre a prática ritual e simbólica da nossa Ordem, o que através de uma forma profícua e benéfica melhor integrará os Irmãos no seio da nossa comunidade. E falando em comunidade e em partilha, Estar Aprendiz é também aprender com a permuta de sentimentos entre os Irmãos, numa ampla comunhão fraternal de afetos que potenciam a egrégora e a vivência da família maçónica. Pois todos nós pertencemos à mesma Família apesar de não sermos Irmãos “de sangue” mas que o somos através da Virtude.

  E Estar Aprendiz para além desta vivência e caminho pela Virtude, é também por sua vez, desejarmos ir mais longe, ambicionarmos mais e melhor, servirmos de exemplo para os outros através da nossa conduta, ajudar os outros sem nada esperar em troca, nunca baixarmos os braços face à adversidade, a estupidez e a ignorância, mas antes combatê-las veemente.

No fundo, “Estar Aprendiz” é um way of life for a lifetime

“Um modo de Vida para uma Vida…”

Um estado que será de uma luta constante e onde se terá de ser persistente em permanência. E quem não tiver essa noção ficará pelo caminho…

 Na Maçonaria, a preguiça e o ócio não são bem acolhidos, de tal modo que a Luz/Conhecimento só se alcançam fruto de muito estudo, disciplina e motivação. Tudo qualidades que devem fazer parte de um processo formativo. E como tal, considero a Maçonaria como uma escola de Homens de Bem que se querem tornar ainda melhores…e costumo afirmar que:
“Na Maçonaria aprende-se, trabalhando…”.

 Por isso quando me perguntam se é fácil ser Aprendiz, eu respondo que não! Porque se assim o fosse, eu não estaria aqui…
 E para terminar, gostaria de partilhar convosco esta reflexão que me tem acompanhado ao longo da minha Vida:
“Pouco ou nada sei e no entanto existe tanto por aprender…”
Disse, Venerável Mestre. Meus Irmãos…

14 novembro 2016

Fraternidade


Mas afinal em que consiste a apregoada Fraternidade dos maçons?

Fraternidade é um espaço, uma cultura, uma postura, um sentimento, que junta um conjunto de pessoas numa teia de relações similares às que se criam ente irmãos de sangue. Tal como os irmãos no seio de uma família, brinca-se, exerce-se o mútuo auxílio, colabora-se, ajuda-se o outro a crescer e cresce-se com a ajuda do outro. Mas também tal como os irmãos no seio de uma família, discute-se, amua-se, têm-se zangas e reconciliações, disputas e alianças.

Fraternidade não é um oásis de sol e delícias. Fraternidade é a vida vivida em conjunto, com união mas também com busca de cada um do crescimento da sua individualidade no seio do grupo.

Fraternidade implica que quando um dos nossos é injustamente acusado nos levantemos, com indignação, em defesa da honra de quem sofreu o ataque da injustiça. Mas também implica que, quando um dos nossos erra e acusa injustamente alguém, seja severamente criticado. Porque, afinal, o nosso objetivo comum é que todos e cada um de nós se aperfeiçoe e isso impõe que se mostre o erro quando existe, se exija a sua reparação, se necessário se aplique a devida sanção, se aponte a senda correta, em vez do carreiro da injustiça.

Fraternidade é saber-se que nenhum de nós é perfeito, mas efetivamente prosseguir o compromisso, connosco e para com os demais, de cada um desbastar sua pedra e alisar suas imperfeições. E, quando se erra, reparar o mal, não persistir no erro e tirar a lição para agir e ser melhor no futuro.

Particularmente exigente é a situação em que um dos nossos é injustamente visado por um dos nossos, quando o erro parte de dentro de nós e atinge um de nós. Aí, a Fraternidade não exige - pelo contrário! - que nos abstenhamos de intervir, porque afinal o problema é dentro de casa. Aí há que intervir com particular acuidade, pois o injustiçado sente exponencialmente a injustiça quando vinda de um dos seus e quem erra tem de compreender que o seu erro tem de cessar prontamente e de vez, pois põe em causa o Irmão, o conjunto de Irmãos e, assim, ele próprio, ao colocar em crise a confiança subjacente ao relacionamento fraterno.

Em grupos coesos e fraternos vemos frequentemente ocorrer conflitualidade, A Fraternidade não impede essa existência. Mas os grupos coesos e fraternos aprendem e sabem como gerir os conflitos e torná-los fatores de melhoria e de avanço, individual e coletivo. O que importa é que, acima de tudo, exista respeito, consideração e disposição para a cooperação. 

Fraternidade gera muitas vezes amizade. Mas não necessariamente. Podem-se estabelecer relações fraternas, coesas, gratificantes, eficazes para a melhoria mútua com pessoas com quem não se estabelecem particulares relações de amizade. Porventura os temperamentos serão diferentes, mas os objetivos são comuns e o auxílio mútuo é reconhecido como o melhor caminho.

Mas também a amizade, por si só, não gera a Fraternidade. Porque a amizade pode ser mansa e plácida e agradável, mas não ser fator de crescimento, de melhoria.  Fraternidade implica desafio, emulação, auxílio competitivo mesclado com respeito e confiança mútuos, que cria as condições para que todos avancem.  

Mas quando a Fraternidade gera a amizade e ambas são vividas e praticadas em prol do crescimento dos amigos fraternos, então a eficácia da Fraternidade é exponencial.

Lembrei-me disso ao reler o texto, já antigo de mais de seis anos aqui no blogue, Os dois marretas. Ilustra como dois desconhecidos se encontram, por obra do acaso ou pelos desígnios do Grande Arquiteto do Universo, inseridos numa Fraternidade. Como são diferentes um do outro. Como aprenderam a complementar-se nas suas diferenças. Como souberam potenciar o apoio mútuo no crescimento de ambos. Como nesse processo nasceu, cresceu e se mantém uma singular amizade, não decorrente das semelhanças, mas regada pelo inteligente aproveitamento das diferenças e sempre adubada pela indestrutível confiança mútua.

E é assim, pela conjunção da Fraternidade conjugada com a amizade, ambas habilmente aproveitando o potencial das diferenças, que continua hoje a ser verdade o que já era verdade há anos atrás (e cito daquele texto): quando (o acordo) chega ou quando nunca chegou a haver desacordo, todos sabem que é melhor sair da frente, que estes dois, quando decidem puxar para o mesmo lado, são ossos duros de roer...

E isso também é Fraternidade!

Rui Bandeira

07 novembro 2016

"Palavra Maçónica"


O texto que hoje publico é um texto de minha autoria que viu a luz anteriormente noutro espaço em que debitava umas linhas sobre Maçonaria. Este texto pode ser consultado no seu original aqui.
E como considero que sua atualidade permanece, irei transcrever o mesmo texto nas linhas abaixo para Vosso conhecimento:

"Palavra Maçónica"

A “palavra maçónica” é um compromisso de honra efectuado pelo neófito quando tem contacto com os Mistérios da Arte Real. No qual ele se compromete a honrar e dignificar a Maçonaria, bem como em guardar segredo do que vir ou tomar conhecimento em sessão ritualista maçónica.

E como tal, nada mais é importante para o maçom do que respeitar a sua palavra, a sua palavra dada, a sua palavra de honra.
Sendo por isso, que uma das suas obrigações é a de ser um homem de bons costumes. Alguém que é honrado e vive sob bons preceitos morais.

Quando um maçom se compromete com algo, ele o cumpre ou o faz por cumprir, porque é a sua palavra que fica em questão. Se não o fizer, a sua credibilidade perante os seus irmãos e porventura demais profanos, será posta em causa, correndo o sério risco de ficar descredibilizado, e assim não poder viver da forma honrada como assim o deve fazer.

Essa palavra, vale mais que “mil assinaturas”, pois jamais poderá ser rasurada ou apagada. Quando ela é assumida, ela torna-se um compromisso para a vida do maçom. Tanto que a sua palavra deverá ser “eterna e imutável”. Logo será sempre um dever a ser cumprido!
Por isso, um maçom quando assume um compromisso ou quando opina sobre determinado tema ou matéria, tem de ter o cuidado e a parcimónia necessária. Pois com a sua opinião também pode ele pôr em causa a Maçonaria na sua generalidade.

Normalmente quando alguém opina publicamente, apenas essa opinião o vincula a ele próprio. Mas em Maçonaria isso é diferente. E diferente porque, quando um maçom opina na via pública, as suas afirmações encontram um eco desproporcionado por vezes em relação ao que afirma. E tudo fruto do que a sua imagem enquanto maçom suscitar. 
A curiosidade sobre o que se passa no interior da Maçonaria é tão grande por parte dos profanos, que isso origina um excesso de “ruído” que maioritariamente causa um impacto negativo na Ordem em si. E é por isso que um maçom deve ser reservado quanto ao que opina, como opina e onde exerce a sua opinião. 
Aliás, se existe alguém que falará pela Obediência em si, serão apenas o Grão-Mestre e o Grande Orador, os restantes Irmãos apenas poderão opinar, mas vinculando-se apenas a si próprios nas afirmações proferidas.

Já na vida interna das Obediências Maçónicas, as palavras dos irmãos são muito bem-vindas, isto é, cada um (excepto se em sessão litúrgica, os Aprendizes e Companheiros se abstêm de falar) é livre de opinar sobre o que quiser, respeitando apenas as regras impostas pela Obediência, seja no cumprimento dos Landmarks (no caso de Obediências Regulares) seja no cumprimento do seu Regulamento Geral.

Resumindo, o segredo que existe na palavra de um maçom, encontra-se à vista de todos. É apenas se tomar atenção ao que diz e como o diz.

31 outubro 2016

Os Landmarks da Maçonaria Regular: a Regra em 12 pontos


Em inglês, "Land" significa "terra" e "mark" traduz-se por "marca", "alvo". "Landmark" é, assim, a marca, o sinal, na terra, e, mais especificamente, os sinais colocados nos terrenos para assinalar a sua delimitação em relação aos terrenos vizinhos. Em suma, "landmark" é, em português, o marco, no sentido de marco delimitador de terreno.

Fazendo a transposição para a Ordem Maçónica, Landmarks são, correspondentemente, os princípios delimitadores da Maçonaria, isto é, os princípios que têm em absoluto de ser intransigentemente seguidos para que se possa considerar estar-se perante Maçonaria Regular.

Ou seja, os Landmarks são o conjunto de princípios definidores do que é Maçonaria. Só se pode verdadeiramente considerar maçom quem, tendo sido regularmente iniciado, seja reconhecido como tal pelos outros maçons e observe os princípios definidores da Maçonaria constantes dos Landmarks.

Porque definidores do que é Maçonaria Regular, os Landmarks fixados são imutáveis.

Porém, existe um problema: não existe uma lista “oficial” de Landmarks comum a todo o mundo maçónico! São conhecidas várias listas de Landmarks, elaboradas por maçons estudiosos e ilustres, mas… por muito estudiosos e ilustres que foram, nenhum tinha mandato específico para fazer essa definição!

Há listas de Landmarks elaboradas por Albert G. Mackey (25) , George Oliver (31), J. G. Findel (9), Albert Pike (5), H. G. Grant (54), A. S. Mac Bride (12), Robert Morris (17), John W. Simons (15), Luke A. Lockwood (19), Henrique Lecerff (29).

Estas listas de Landmarks, repito, não vinculam senão os seus autores e espelham, além dos seus conhecimentos, também os seus preconceitos e os das suas épocas. É célebre, por exemplo, o Landmark 18 de Mackey que, além de afirmar a masculinidade da Maçonaria, impõe que nem escravo nem aleijado possa ser admitido maçom. Perante o evidente preconceito de Mackey, fruto da época e ambiente em que vivia, modernamente faz-se uma interpretação “habilidosa” do Landmark e postula-se que o maçom deve ser “livre de vícios” e não deve ser “aleijado de caráter”. Mas, meus caros, não foi isso que Mackey quis dizer e disse: Mackey escreveu que “os candidatos à Iniciação devem ser “isentos de defeitos ou mutilações, livres de nascimento e maiores”. Manifestamente que se referia a defeitos e mutilações físicas, não morais. Evidentemente que, para ele, ser “livre de nascimento” não tinha nada a ver com ser nascido livre de vícios (pois todos nascemos sem vícios – quem os tem, adquire-os mais tarde), antes se referia a não ter nascido escravo. Repare-se que nem sequer os escravos libertos, segundo Mackey, podiam ser maçons… Percebe-se talvez assim porque é que algumas Grandes Lojas do Sul dos EUA, ainda eivadas de muito racismo, continuam a defender que Prince Hall não foi validamente iniciado maçom, pois o homem foi escravo liberto…

Nos tempos de hoje, com a evolução de mentalidade que (felizmente) houve no último século, esta postura preconceituosa não pode ser admitida. Daí a interpretação “habilidosa” a que me referi. Mas, se os Landmarks são imutáveis, então tem igualmente de o ser a sua interpretação! Logo, não há que interpretar habilidosamente o Landmark 18 de Mackey. Há que, pura e simplesmente afirmar, alto e bom som e de cabeça levantada, que aquilo não é Landmark nenhum, e ponto final!

Algumas Grandes Lojas optaram por criar listas de Landmarks próprias. É o caso, por exemplo, das Grandes Lojas de New Jersey (10), do Tennessee (os 15 de John W. Simons), do Connecticut (os 19 de Luke A. Lockwood), do Minnesota (26), do Massachussets (8), do Kentucky (os 54 de H. G. Grant) e a Grande Loja Ocidental de Colômbia (20).

Na Europa, a Grande Loja Nacional Francesa codificou o que designou de “Regra em 12 pontos”, pela qual definiu o que se contém dentro do conceito de Maçonaria Regular – ou seja, definiu os seus Landmarks da Maçonaria Regular (http://www.glnf.fr/fr/Regle-en-douze-points-franc-maconnerie-238).

Que tem isso de diferente ou especial, uma vez que, como acima referi, várias outras Grandes Lojas fizeram o mesmo? A diferença – de que o tempo se encarregará de nos mostrar a sua real relevância – é que, enquanto cada uma das Grandes Lojas da América que fixaram Landmarks o fizeram por si e sem preocupações de alinhamento ou partilha com as demais, a iniciativa da GLNF tem conduzido a um movimento de expansão da Regra dos 12 Pontos, de aceitação desta codificação de Landmarks por outras Obediências.

A Grande Loja Legal de Portugal/GLRP adotou também a Regra em 12 Pontos (https://www.gllp.pt/index.php/as-doze-regras-da-maconaria-regular). A Grande Loja de Espanha assim o fez também (http://gle.org/la-regla-en-12-puntos/). Mas o movimento não é só europeu. Várias Grandes Lojas africanas de países de expressão francesa também adotaram a Regra em 12 pontos, designadamente a Grande Loja Nacional Togolesa (http://glnt.tg/ e aí ir a Les principes fondamentaux/ La règle en 12 points). Também a Grande Loja de Moçambique adotou a Regra em 12 pontos (a GL de Moçambique não tem ainda sítio na Internet; têm de acreditar na minha palavra…).

A Regra em 12 pontos, verdadeiros Landmarks da Maçonaria Regular, vai sendo progressivamente adotada por Obediências Regulares da Europa e de África. É tempo de a divulgar junto dos Irmãos da América Latina – talvez no âmbito da Confederação Maçónica Interamericana.

Rui Bandeira