28 setembro 2015

Comunicação do Grão-Mestre da GLLP/GLRP à Assembleia de Grande Loja no Equinócio de Outono


Da Regularidade:

Enquanto Grão Mestre da Grande Loja Regular de Portugal, encerro nesta Grande Loja de hoje, um ciclo completo: dois solstícios: dois equinócios: um ano solar, fecho com o compasso maçónico um círculo justo e perfeito.

Antes de mais, agradecer a todos: as horas felizes, os sorrisos, a força, as ajudas, a lealdade, a harmonia, o companheirismo fiel e fraterno.

Dizer ainda que crescemos em Obreiros e em Lojas, que nos fortalecemos, que nos consolidamos, que aumentamos a nossa estruturação e eficácia, o nosso rigor, e através de uma sede de Grande Loja renovada e mais fina e ritualmente adornada, damos corpo a uma melhor imagem de nós, mais bela, espaço repositório da história e memória da nossa Obediência, mais condizente, mais justa e perfeita.

Sendo a nossa sede local onde trabalham 21 Lojas nos dois templos ali consagrados, é no entanto o espaço de todos os Mações e de todas as Lojas da GLLP/GLRP, visitável por Irmãos, Famílias e profanos em horários pré-determinados.

Mantivemos e reforçamos os nossos relacionamentos internacionais credibilizando ainda mais a nossa Grande Loja e demos corpo ao reforço estratégico dos laços da lusofonia.

E por fim conversar convosco sobre Regularidade. E falar-vos deste tema, porque somos uma grande Obediência Maçónica que se filia com total plenitude na Regularidade Maçónica, a maior família maçónica do planeta, que conta já com muitos séculos de tradição.

Por vezes somos levados a não valorizar suficientemente a real importância da nossa Regularidade, porque nos esquecemos que funcionamos tal uma orquestra sinfónica, totalmente afinada: embora o maestro seja fundamental para marcar o tempo, cada músico tem que cuidar do seu instrumento, da sua partitura, da sua melodia, manter-se a si próprio aprumado e ensaiado, estar atento e seguir escrupulosamente o tempo que a batuta do maestro dita, para se poder atingir a coesão e a coerência, para se poder realizar uma execução com unidade interpretativa, em plena harmonia.

E embora o maestro conte imenso, cada um dos restantes elementos conta igualmente imenso. Obrigado a todos por mantermos esta contínua harmonia, obrigado a cada um pelo papel fundamental que tem sido capaz de interpretar e desempenhar.

A regularidade maçónica é filiação que se conquista arduamente, é realidade que se merece depois de conseguida a harmonia, mas é também realidade que se mede ininterruptamente, e que por isso se pode perder a cada nova sinfonia que a nossa orquestra queira interpretar, porque a maléfica tentação da cacofonia espreita insistentemente, o individualismo desintegrador ameaça todos os dias, mas eu garanto-vos que serei sempre um devorador de desunião, um comedor de egocentrismos, um maestro da união e da harmonia.

Não queiramos apenas acreditar nas nuvens de algodão que descobrimos pelas janelas dos aviões, porque elas já foram beber a todas as gotas de orvalho, a todos os rios, a todos os lagos, a todos os mares, a todos os oceanos! Também assim se forma a regularidade maçónica universal, tal uma cadeia que se irmana através de elos que são cada Irmão, cada Loja, cada Grande Loja, cada confederação de Grandes Lojas, continuamente escrutinadas pela Grande Loja Unida de Inglaterra: tal uma romã, a tal meligrana que em várias ocasiões já vos falei.

Sem complexos, servilismos ou perda de soberania da nossa Obediência, a Grande Loja Unida de Inglaterra é uma autoridade indisputável no que a questões de Regularidade dizem respeito, não só porque é a Grande Loja fundadora da Maçonaria tal como a conhecemos mas porque ao longo dos anos emitiu e produziu doutrina sobre a Regularidade constituindo-se assim um referencial incontornável.

E se perdermos a regularidade o que seremos? Pura e total insignificância! Um grupo de homens livres que quer muito ser maçon, mas a quem mais ninguém no mundo lhe reconhece essa qualidade, porque deixamos de emanar luz, para ser apenas reflexo de passageiras venturas, olvidado que já foi o farol primordial que nos alicerça na nascente, que através da distância e do tempo se purificou, sem que qualquer ilusão ou miragem o venha reinventar, amortalhando assim a resplandecência da pureza inicial: e nada mais que grandes ilusões permanecerão, grandes vazios, grandes dissidências e desuniões, paraísos falsos totalmente perdidos.

Pode haver a tentação de deixarmos subir através de nós a vontade de noite, trazida por um ímpeto silêncio que acaricia a pele dos nossos egoísmos, enquanto se estende um imenso lençol de pesada sombra aniquiladora, tão serena que até dá tempo à concretização de todas as grandes destruições, que nos precipitarão em plena garganta de todos os precipícios.

Mas nós preferimos antes sonhar o rio da união como quieta lagoa que não tem que suportar o arrepio, nem tolerar saltos incertos e ousados de contrabandistas que navegam no fio da navalha dos abismos, porque a eternidade Regular, nunca acabará de passar, por isso seguiremos em justo e harmonioso silêncio, o silêncio justo da tradição e da universalidade, para não sermos esmagados pelas desilusões!

E vou continuar a falar-vos do tema da regularidade, mas agora de uma outra regularidade, a regularidade democrática em que o nosso País, o nosso querido Portugal, já se mantem há mais de quarenta anos. E falar desta regularidade democrática, porque se vão mais uma vez desenrolar eleições livres no próximo dia 4 de Outubro, o ato popular e universal que consubstancia a regularidade democrática de cada estado e que a Maçonaria tanto lutou. E não me atrevendo a opinar sobre os partidos políticos que a elas concorrem, creio constituir elemento relevante, o Grão Mestre alertar todos os maçons da sua Augusta Ordem, para que sejam cidadãos intervenientes mas inteiros, agentes plenos de cidadania, que nunca deixarão o seu país derivar para obscurantismos e outros regimes totalitários, por isso serão agentes valorizadores da democracia plena e portanto do ato popular mais sagrado das democracias modernas: as eleições livres.

Dizer ainda que durante estas últimas quatro décadas vividas em democracia, Portugal mudou radicalmente para melhor, tendo sido capaz de responder cabalmente a vários grandes desígnios e causas nacionais tal: a liberdade, a democracia, a descolonização, a infra-estruturação básica, a Europa, o desenvolvimento.

Mas ficam-nos ainda vários grandes desígnios nacionais por resolver, e dentro dos mais prementes, penso ser muito importante frisar três fundamentais: a coesão e justiça social, a coesão e justiça territorial, o respeito e defesa do ambiente.

Coesão e justiça Social para que sejamos realmente capazes de amenizar os sofrimentos dos mais desprotegidos e frágeis, não os deixando em sofrimento à beira da estrada.

Coesão e justiça territorial, de forma a esbatermos o fosso que se cavou entre o litoral mais povoado, mais rico e desenvolvido e o interior em contínuo e total abandono, caminhando a passos largos para o total despovoamento, muito mais pobre, profundamente deprimido e muito menos desenvolvido que a finíssima faixa litoral.

E por fim o respeito e defesa do ambiente, porque apenas temos este país e este planeta para viver, e temos o dever de os deixar aos nossos vindouros, pelo menos em tão bom estado de saúde, como aquele que recebemos dos nossos ascendentes.

É ainda importante frisar, que foi apenas no mês passado, que pela primeira vez um presidente em exercício nos EUA, o nosso Irmão Barack Obama, pisou o Ártico americano, para enfatizar a necessidade do combate drástico ao aquecimento global: e nós por cá não queremos nada que o nosso litoral se afunde, nem o nosso interior se erme!

E neste tempo de equinócio, a União da grande família dos maçons regulares, é de rigor: façamos o mundo mais feliz, e por contágio, sejamos todos mais felizes.

E era esta a mensagem simples que hoje vos queria comunicar, e dela imbuídos, continuaremos o nosso caminho, humildemente, harmoniosamente, assumindo a plenitude universal da nossa Regularidade Maçónica, como a regularidade democrática para Portugal, para continuar a consolidação e edificação da nossa Augusta Ordem, a bem da Humanidade, à Glória do Grande Arquiteto do Universo.

Júlio Meirinhos
Grão Mestre

21 setembro 2015

O Silêncio dos Aprendizes (republicação)

O texto que hoje remeto para Vossa leitura é um texto do já "longínquo" ano de 2009 e saiu da pena do A.Jorge e retrata a sua experiência enquanto Aprendiz e o que ele sentiu durante esse período em relação ao silêncio que lhe era imposto pela Loja.
 - Silêncio este que é imposto a todos os Aprendizes e Companheiros durante o seu tempo de frequência nesses graus -.

Aqui fica o seu testemunho:

"Ao escolher este tema presto homenagem ao silêncio dos aprendizes em loja e em particular ao seu significado e objectivos, dado considerar que ele contribuiu decisivamente para a minha aprendizagem e para a minha evolução como pessoa e, espero que, como Maçon.

Nas conversas prévias que tive com os Irmãos Mestres J:. R:. e R:. B:., integradas no meu processo de admissão à Maçonaria, houve desde logo algo que me causou alguma apreensão – como iria eu conviver com o silêncio que se impunha aos aprendizes em Loja. Ter uma opinião para transmitir e não o poder fazer, só poderia ser uma forma sofisticada de praxe ou de tortura, para ver se eu me aguentava....

Sendo normalmente uma pessoa interventiva, o ficar calado significava para mim quase que uma prova de fraqueza ou ignorância, e isso era algo que não estava habituado. No mundo profano, nomeadamente nas esferas empresariais, é normalmente preferível dizer alguma coisa, mesmo que inútil, do que não dizer nada, já que isso parece ser apreciado.

As minhas primeiras sessões em loja foram muito conflitivas – se não podia falar e só podia ouvir, o que é que eu estava ali a fazer? Durante este período, passei por várias fases evolutivas: equacionei ir-me embora, já que não queriam ouvir o que eu tinha para dizer e eu tinha muito para dizer; ponderei os inconvenientes de desrespeitar a regra, rompendo o silêncio; efectuei comparações entre os argumentos que eram utilizados e os que eu utilizaria na mesma situação, etc.. Creio que posso afirmar que a minha permanência na Maçonaria se deve a um acto de teimosia, já que decidi não desistir e ir até ao fim.

Gradualmente, fui começando a alterar a minha atitude perante o silêncio, principalmente a partir do momento em que conclui ser inútil preocupar-me em construir uma argumentação que depois não teria continuidade. Já que não podia falar, talvez existissem outras formas de rentabilizar o tempo que ali passava e a forma mais lógica e imediata parecia ser, ouvir e assimilar o que estava a ser dito. Tal “descoberta” fez-me começar a escutar de forma consciente, o que efectivamente se dizia, o que me conduziu a uma nova descoberta acerca de mim próprio: tinha tendência para só escutar os outros em função da resposta que teria de lhes dar e não por aquilo que tinham para me dizer.

Esta constatação levou-me a começar a tentar escutar os outros de forma desinteressada e sem reservas ou intenções. Foi um processo intencional, lento, com avanços e retrocessos mas extremamente agradável - sentir que começava a descobrir os outros e ver que a atitude destes se alterava gradualmente. De forma tímida no inicio, primeiro nos círculos familiares e depois entre amigos e em ambientes profissionais, foi encorajante ouvir frases como “não sei porquê, mas agora é mais agradável conversar contigo”...

No campo estritamente profissional e nomeadamente nos processos negociais, em que cada argumento antecipado pode constituir uma vantagem para os outros, descobri também que o escutar me permitia analisar melhor a situação e sobretudo preparar melhor a argumentação necessária à consecução de estratégias ganhadoras.

E no entanto toda esta simplicidade parece ser fruto de uma sabedoria milenar que já Hiram utilizava quando formava os seus aprendizes e companheiros, para os preparar para a construção do Templo de Salomão.

Quando o recém iniciado é advertido de que não poderá falar em loja, desde a sua iniciação até à sua passagem a mestre, devendo apenas ouvir e observar, está-se simplesmente a dar continuidade a um dos mais antigos costumes das ordens iniciáticas: o silêncio.

Voltado para si mesmo, calado, numa postura de reflexão e recepção, o Aprendiz Maçon deverá evitar resvalar para uma atitude passiva ou desinteressada. Pelo contrário, todos os seus sentidos devem estar atentos para o que se passa em loja. Ver, ouvir, receber, reflectir e guardar, são as palavras chave deste processo de aprendizagem e evolução interior. Juntar e interligar todas as informações que lhe chegam ao cérebro, estranhas e diferentes das que já conhece, formulando hipóteses e conclusões que lhe permitam uma visão cada vez mais elevada das observações que faz. Esta deve ser a maior preocupação do iniciado.

O ainda candidato é exposto pela primeira vez perante a regra de silêncio quando é introduzido na Câmara de Reflexão, permanecendo sozinho e ladeado por símbolos, palavras e frases, estimulado a pensar e a penetrar no fundo do seu interior. No silêncio da meditação, vai ao encontro de si mesmo, examinando minuciosamente o que lhe vai na alma. É então confrontado com a sigla Vitriol (Visita Interiora Terrae, Retificandoque, Invenies Occultum Lapidem), que na sua tradução para português significa: "desce ao interior da terra, e perseverando na rectidão, poderás encontrar a pedra oculta".

Após toda a cerimónia de iniciação, o candidato profano transforma-se em recipiendário silencioso, o recém iniciado assume o papel do hermetista, ou do alquimista na sua busca incessante da Pedra Filosofal, que uma vez descoberta, o transformará no homem perfeito. Este é o sentido que o maçom busca quando luta para transformar a sua Pedra Bruta na Pedra Cúbica, que poderá utilizar e encaixar perfeitamente na construção do seu novo Templo interior.

O conselho "lege, lege, relege, ora, labora et invenies", que significa lê, lê, relê, ora, trabalha e encontrarás, era dado ao eleito para conhecer e assimilar os mistérios da Alquimia. Hoje, continua sendo este o conselho dado ao iniciado. O maçon afasta lentamente todas as suas paixões, os seus vícios, os seus desejos incontroláveis, para vê-los transformarem-se em virtudes, domínio de si mesmo, tolerância e prudência, alcançadas no silêncio e na introspecção. O iniciado reconhece como fundamentais, as palavras "Vigilância e Perseverança" nas metodologias do seu estágio de observação. Quem fala muito pensa pouco, ligeira e superficialmente, e a Maçonaria quer que seus membros sejam melhores pensadores do que faladores.

Todo este processo pretende, na sua essência, preparar e induzir ao Aprendiz a necessidade da reflexão como método de transformação interna. Embora indirectamente, é possível estabelecer vários paralelismos e interacções com o Catecismo do 1º grau, nomeadamente:
  • Quando o Aprendiz afirma vir “vencer as suas paixões, submeter a sua vontade e realizar novos progressos na Maçonaria”, logo seguido de “Porque um Maçon deve desafiar-se a si próprio e evitar juízos de valor antes de consultar a sabedoria dos irmãos”. O silencio proporciona-lhe um método de progressão e impõe-lhe uma prática de reflexão que o levará a ponderar os seus juízos de valor em função de conhecimentos que deve reconhecer como mais profundos.
  • Na resposta “Antes queria ter a garganta cortada do que revelar os segredos que me foram confiados”, que pressupõe não só dedicação e respeito pela Ordem, mas também a capacidade de responder ou reagir após um processo de interiorização e valoração, que a pratica do silencio poderá ajudar a tornar inconsciente e natural.
  • Na resposta “Porque todas as forças destinadas a desenvolverem-se utilmente no exterior devem primeiro concentrar-se em si mesmas”, em que claramente transparece a necessidade de um trabalho interior prévio em que o silencio pode e deve ser uma peça fundamental.
Se mais não houvesse para aprender na Maçonaria, o ter conhecido o valor do silencio e tudo aquilo que este me proporcionou, já teria valido a pena.

Partindo de um silencio imposto, cujas motivações se fundamentam na sabedoria milenar do grupo e que constitui como que um tirocínio para o recém iniciado, passa-se para uma fase de utilização em termos interiores do silencio, evoluindo finalmente para um estadio de admiração pelo silencio em que a imposição se transforma em voluntariado que assim se transforma em sabedoria, fechando o círculo e preparando o iniciado para novas fases da sua evolução e do seu crescimento interior."

A. Jorge em 27.04.6000

14 setembro 2015

Igualdade, Diversidade, Tolerância (republicação)

O texto que hoje é "reciclado" é um texto que o Rui Bandeira escreveu à cerca de 2 anos e que pode ser consultadoaqui , mas cuja atualidade persistirá durante muitos mais...
Assim deixo-Vos o texto abaixo publicado para a Vossa leitura:

"Igualdade, Diversidade, Tolerância

Os maçons prezam a Igualdade. Esta está na matriz genética do que é a Maçonaria. Na Loja, todos são essencialmente iguais, mesmo que alguém dirija, alguém assista quem dirige, alguém ensine e alguém aprenda. Porque todos foram e potencialmente serão tudo, todos fizeram e potencialmente farão tudo em Loja. A dignidade da condição humana é exatamente igual em todos e cada um, quaisquer que sejam as suas habilitações, as suas aptidões, as suas realizações. Cada maçom está entre iguais quando está entre os seus Irmãos. Mais: cada maçom reconhece e preza a essencial Igualdade entre todos os membros da  espécie humana, independentemente de cores de pele, de nacionalidades, de crenças, de lugares ou de estilos de vida.

Os maçons prezam, também, e em igual medida, a Diversidade e o corolário desta, a diferença. Em Loja, é patente a riqueza advinda do confronto e da cooperação de diferentes experiências, capacidades, opiniões, formações. Por isso, não tiveram nem têm normalmente êxito avulsas experiências de criação de Lojas "monocolores", de médicos ou de músicos ou do que quer que seja, acumulação de experiências semelhantes que, por regra mais cedo do que tarde, se revela entediante e pouco apelativa. Os maçons aprendem e praticam o inestimável valor da diversidade, aprofundam o estimulante potencial da diferença. Cada um contribui com as suas valências, os seus saberes, os seus gostos, as suas experiências, em suma, com a sua individualidade, para enriquecer o grupo e os demais. E cada uzm aprende, enriquece-se, com o que depara de diferente, com diversos pontos de vista que lhe aguçam e estimulam o intelecto e o espírito crítico.

A  Igualdade não pressupõe, não se faz, de similitude. A Igualdade aceita, resulta, da multitude de diferenças que existem na Diversidade.

A Tolerância é a ferramenta que harmoniza a Igualdade e a Diversidade. Entender que os nossos iguais não deixam de o ser porque pensam diferente de nós, aceitar que as diferenças de aspeto, de cor de pele, de experiências, de culturas, não afetam a essencial Igualdade da natureza humana, expressa na individualidade de cada um, é a natural postura que permite, mais do que possibilitar, mais do que meramente compatibilizar, efetivamente rentabilizar a Diversidade existente na Igualdade. Por isso a Tolerância não emerge de qualquer sentimento de pretensa superioridade do que tolera em relação ao tolerado; pelo contrário, a Tolerância pressupõe, enraíza-se, cresce a partir da noção de que o outro é essencialmente igual a mim e acessória e inevitavelmente apresenta diferenças em relação a mim. Diferenças que é estulto julgar, catalogar ou, pior, ridicularizar ou ostracizar; pelo contrário, diferenças que me enriquecem na medida em que as considerar, com elas aprender, integrar nos meus saberes, nas minhas posturas, na minha individualidade - que, por natureza, é diferente de todas as demais... 

A Igualdade é o campo que cada ser humano tem em comum, o solo que todos pisamos, a terra que a todos nós molda. A Diversidade são as diferentes culturas que sobre essa terra comum se semeiam, granjeiam  e, a seu tempo, se colhem, todas diferentes, todas importantes, apesar das suas diferenças, afinal devido às suas diferenças. A mesma terra dá o cereal de que se faz o pão, cria o fruto de que se fabrica o vinho, desenvolve o algodão de que se faz tecido. A Tolerância é a alfaia que trabalha a terra e semeia, granjeia e colhe as culturas.

A essencial Igualdade de todos os seres humanos é uma indispensável base com um inestimável potencial, concretizado numa miríade de diferenças que constituem a formidável riqueza da Diversidade. A Tolerância é o meio pelo qual se aproveita o potencial e se cria a riqueza, a forma como, assumindo a comum base de partida, se propicia a inestimável infinidade de caminhos que podem ser traçados, cruzados, percorridos por iguais com diferentes anseios e diversas caraterísticas, sementes diversas lançadas à mesma terra produzindo inumerável variedade de frutos.

Compreender que todos somos essencialmente iguais, valorizar as diferenças inerentes à nossa individualidade, articular o que é comum com o que é diverso com a harmonia da Tolerância, são caraterísticas imanentes da Maçonaria, presentes desde sempre na sua matriz formadora. Para os maçons, reconhecer a Igualdade e Tolerar, isto é, aceitar, valorizar e aproveitar a Diferença, é pura rotina, algo tão natural como respirar.

No dia em que todos em toda a Humanidade conseguirem compreender e praticar que o ser humano, sendo essencialmente Igual aos seus semelhantes só se valoriza. se potencia, se realiza pelo exercício e aproveitamento das suas diferenças, constituindo o conjunto de todas elas a enriquecedora Diversidade da espécie humana, tão mais enriquecedora e propiciadora do progresso e do bem comum quanto mais bem Tolerada, aceite, fomentada for por todos e cada um, nesse dia finalmente as trevas do obscurantismo serão vencidas pela Luz da razão.

Para que esse dia chegue trabalham, dia a dia, incansáveis formiguinhas obreiras, os maçons. Esta a Grande Conspiração Maçónica! Esta a Nova Ordem Mundial por que anseiam! Os maçons e todas as pessoas de bem e livres de preconceitos!"

Rui Bandeira

07 setembro 2015

O Vigésimo Quarto Venerável Mestre


Para o ano maçónico de 2013/2014, o obreiro consensual para assegurar o exercício do ofício de Venerável Mestre e, consequentemente, candidato único proposto por todos os Mestres presentes na sessão para o efeito destinada, foi J. D..

J. D. era um dos mais antigos obreiros da Loja, sempre muito participativo nela. Aquando da crise da cisão, desgostou-se e afastou-se. Anos depois, ainda bem antes da reunificação, voltou. Com a naturalidade dos nossos, reintegrou-se. A seu tempo, assegurou a função de Segundo Vigilante, um Segundo Vigilante exigente, que muito bem formou os seus Aprendizes. Na altura própria assegurou a função de Primeiro Vigilante e ultimou a formação de toda uma geração de obreiros da Loja Mestre Affonso Domingues. Era chegado o tempo de mais um dos históricos obreiros da Loja a dirigir e a sua eleição - como sempre na Loja Mestre Affonso Domingues - foi consensual.

Duas semanas passadas sobre a eleição, ainda em pelo período de exercício de funções do seu antecessor, J. D. faz saber aos mais antigos que, provavelmente, o melhor era ele renunciar a exercer o mandato para que fora eleito, pois era possível que as circunstâncias da sua vida privada o obrigassem a ausentar-se do país precisamente no ano do seu Veneralato.

Os mais antigos falam uns com os outros, consultam-se, pesam prós e contras, avaliam riscos, procuram superar as perplexidades de uma situação inédita. Em mais de vinte anos de Loja, nunca sucedera, efetivamente, situação semelhante, nunca um Venerável Mestre eleito comunicara, ainda antes da sua instalação, a possibilidade de poder ocorrer situação altamente prejudicial para o exercício do seu mandato.

Não obstante a perplexidade, o consenso não foi difícil. Desde logo, estava em causa um antigo e muito considerado obreiro, que há muito já provara merecer a confiança da Loja para a dirigir e não apetecia a ninguém que afinal não viesse a exercer o ofício para que justamente fora eleito. Aliás, estava-se perante uma possibilidade, não uma certeza... E, afinal, se o problema viesse a surgir, a Loja haveria de o resolver, como anteriormente resolvera todos os problemas com que se deparara...

O sentimento unânime foi, assim, que J. D. não deveria renunciar, deveria ser instalado e exercer o seu mandato e, se se concretizassem as circunstâncias que o levassem a ter de se ausentar do país, então se resolveria o problema.

J. D. foi, assim, instalado, escolheu o seu Quadro de Oficiais, anunciou o seu programa, começou a exercer funções e... pouco tempo passado, a possibilidade mostrou-se inevitabilidade: os mais antigos e o Quadro de Oficiais foram por ele informados que ia ter de estar vários meses fora do país.   

O facto de o pior cenário se concretizar não abalou, porém, a Loja. O alerta que, ainda antes de iniciar funções, J. D. formulara já tinha permitido que se pensasse como se iria resolver o problema  que porventura se viesse a colocar: bastava cumprir o que estava regulamentado! E o que está, na GLLP/GLRP, regulamentado é que, ocorrendo impedimento temporário do Venerável Mestre em funções, a administração transitória da Loja será assegurada pelo Primeiro Vigilante e a direção das sessões pelo Ex-Venerável. 

Todavia, um outro problema havia ainda que superar: a Loja não tinha  ex-Venerável, pois que o Venerável Mestre anterior - como aliás tinha, em devido tempo, informado a Loja, saira do seu Quadro de Obreiros, encontrando-se a dirigir uma outra Loja. Nada que tolhesse a Loja Mestre Affonso Domingues! Recorrer-se-ia ao Venerável anterior a esse e, se necessário, ao anterior a esse... Mas, aqui chegados, a Loja resolveu cumprir o espírito da solução mas inovar na sua execução: nada obrigava a que, na ausência simultânea do Venerável Mestre em funções e do seu ex-Venerável, as sessões da Loja fossem sempre dirigidas pelo mesmo antigo Venerável...

Ficou então resolvido que, enquanto durasse o impedimento de J. D., as sessões da Loja seriam sucessivamente dirigidas por cada um dos antigos Veneráveis que permaneciam no quadro de obreiros da Loja. 

E foi assim que, mais de quinze anos passados, o José Ruah voltou a dirigir uma sessão da Loja - agora sem  o espetro de cisão a assombrar o seu desempenho... -, quase tantos anos passados eu voltei a sentar-me na Cadeira de Salomão, e o Nuno L. e o A. Jorge e o João F. e ..., e... e... (é melhor não prosseguir na lista, senão ainda me esqueço de algum e é injustiça que não quero cometer...). 

Em resumo, se não todos, quase todos os antigos Veneráveis ainda integrando o quadro da Loja foram assegurando a direção das sessões, sempre por convocação do Primeiro Vigilante, que, entretanto e contactando à distância com o Venerável Mestre em exercício, ia "segurando as pontas" administrativas da Loja.

Foi a situação ideal? Não foi, claro! Foi uma solução de recurso, que o ideal é ser o VM em funções a poder assegurá-las.

A administração da Loja processou-se com normalidade? Claro que não! Uma administração de substituição, ainda que temporária, é sempre um "governo de gestão" que só assegura o dia-a-dia e houve problemas de fundo cujo tratamento teve de ser postergado.

Foi uma má situação ou uma situação desconfortável? Foi, claramente, uma situação que gostaríamos que não tivesse ocorrido, mas... verdade, verdadinha, acabou por nos dar muito gozo ultrapassar! Foi uma espécie de "ó tempo, volta para trás",  de relembranças dos mais antigos, de os mais novos verem os mais antigos, "ao vivo e a cores" a dirigir sessões, enfim, o espírito de entreajuda da Mestre Affonso Domingues no seu melhor!

Sobretudo, como muito bem pontuou o José Ruah no seu texto"Do problema que não foi, à solução pelo desafio", "de repente Irmãos que andavam um pouco afastados chegaram-se mais para perto. Vieram para ajudar, com a sua presença mas não só, com as suas ideias, com as suas formas de ver e de fazer. 
E tiramos mais uma lição, a da disponibilidade".

Sobretudo, confirmámos a nós próprios que, juntos e cooperando uns com os outros, haverá muitos poucos problemas resolúveis que a Loja Mestre Affonso Domigues não consiga resolver a contento!

O J. D. acabou por vir a concluir que o seu impedimento não lhe permitia reassumir com utilidade o efetivo exercício do ofício e, lealmente, renunciou ao mandato, possibilitando a eleição de um novo Venerável, que dirigisse a Loja até ao final do ano maçónico - e assim veio a ser um Venerável Mestre que dirigiu apenas duas ou três sessões.

Mas seguramente que não deixou a Loja pior do que a recebeu. Deixou-a mais unida, mais ciente de que a união do grupo lhe possibilitará sempre descobrir e executar as soluções para todos os problemas que, tendo solução, se lhe deparem. Tem um lugar honroso na galeria dos nossos antigos Veneráveis!

Rui Bandeira