08 setembro 2010

33.º = 3.º


Uma das razões pelas quais quem está de fora da Maçonaria tem dificuldade em compreender, na sua plenitude, o que esta é resulta - bem vistas as coisas, naturalmente - de aquele que vê do exterior julgar, apreciar, avaliar, a instituição segundo o paradigma da sociedade em que se insere e não através do paradigma próprio criado pela Maçonaria.

Quem vê de fora tem tendência a conceber a Maçonaria segundo o cânone da hierarquia, que é comum à maior parte das instituições humanas. O Governo é dirigido por um Primeiro-Ministro, que manda nos, ou coordena os, Ministros, que, por sua vez, mandam no seu Ministério, dando ordens aos seus Secretários de Estado, e estes aos Diretores-Gerais, que ordenam aos Diretores de Serviço, que mandam nos Chefes de Repartição, que exercem autoridade sobre os Chefes de Secção, que dão instruções aos Administrativos, que... E todo o titular de um cargo superior hierarquicamente exerce autoridade não só sobre o seu inferior hierárquico imediato, mas por todos os que hierarquicamente estão abaixo deste e de si.

Se pensarmos nas Forças Armadas, idem, aspas, apenas com a diferença de o superior ter o título de General, aquele que está na base da pirâmide, o praça, ser o soldado e, entre um e outro, haver toda uma cadeia hierárquica de Oficiais, Sargentos e Cabos.

Se nos lembrarmos de um clube desportivo, lá está: facilmente visualizaremos a cadeia hierárquica que vai do Presidente da Direção ao roupeiro, passando pelos Diretores, Treinadores, Adjuntos, Capitão de Equipa e seus substitutos, jogadores e demais pessoal.

Se nos detivermos na Igreja do credo religioso maioritário em Portugal, lá temos a omnipresente hierarquia de Papa, Cardeais, Arcebispos, Bispos, Cónegos, Padres e, na aparente base da pirâmide, afinal a sua única razão de ser e de existir, a massa dos crentes.

Em suma, e para não me alongar em exemplos, a maneira comum de ver as instituições da sociedade é de forma hierárquica, em que alguém manda, alguém é mandado e manda, em sucessivos patamares até se chegar a quem só obedece.

A tendência de quem olha de fora para a Maçonaria é vê-la segundo este paradigma e, portanto, considerar que, se no Rito Escocês Antigo e Aceite há 33 graus, os detentores do grau 33.º são os que estão no topo da hierarquia e "mandam" em todos os que se integram nos graus inferiores e o mesmo sucede ao longo da "cadeia hierárquica".

Esta forma de ver a instituição maçónica é profundamente errada e conduz a graves vícios de análise. Persiste quer pelo contágio das demais instituições sociais, quer porque os próprios maçons têm negligenciado o esclarecimento do erro. É por isso que não me escandalizo quando um dos nossos interlocutores afirma - como por vezes sucede - que Fulano era do grau 33 e portanto pertencia ao topo da hierarquia e o que disse ou escreveu há de ter um especial significado, pois integrava o escol dos que mandam. Se este erro persiste, a culpa não é só dos meus interlocutores - é também minha! É, pois, tempo de alijar o fardo da minha culpa e esclarecer!

A Maçonaria não se organiza segundo o princípio da hierarquia. A Maçonaria funciona estritamente segundo o princípio da Igualdade!

A única - e temporária - derrogação destes princípio respeita aos Aprendizes e Companheiros (graus 1.º e 2.º), os quais, por estarem em processo de formação e integração, têm uma diminuição de faculdades, não tendo (ainda) o direito de voto nem o direito de palavra (em reunião formal). Mas esta derrogação da plena Igualdade é temporária e estritamente decorrente da natureza do processo de formação e de integração de Aprendizes e Companheiros. O seu percurso far-se-á com naturalidade até que - sem demasiada demora, mas também sem grandes pressas - aquele que um dia se apresentou à Iniciação se submete ao Ritual de Elevação ao 3.º grau e assume a condição de Mestre Maçom.

A partir desse exato momento, é um Mestre com exatamente os mesmos direitos e deveres e a mesma e igual posição hierárquica que todos os outros Mestres. Nem a antiguidade importa. Nem esta é um posto. O maçom acabado de ser elevado a Mestre pode, no minuto seguinte, ver ser-lhe confiado o exercício de um ofício em loja. E, logo que tenha exercido o ofício de 2.º ou de 1.º Vigilante, pode ser eleito Venerável Mestre, em estrito pé de igualdade com todos aqueles que estão na mesma situação há 1, há 10 ou há 30 anos. E todo aquele que tenha exercido o ofício de Venerável Mestre de uma Loja pode ser eleito Grão-Mestre.

É indiferente, em Loja, se A tem "apenas" o 3.º grau, B o 9.º, C o 15.º, D o 33.º. Todos são estritamente iguais e aquele que tem "apenas" o 3.º grau pode ser eleito Venerável Mestre e dirigir os outros, os que têm o 9.º, o 15.º ou o 33.º grau. Todos os Mestres maçons são estritamente iguais, independentemente do grau dos Altos Graus a que cada um tenha acedido. Um maçom do 3.º grau não é menos, nem mais, do que um maçom do 33.º grau. São ambos Mestres maçons - e com um estatuto rigorosamente igual em Loja. Um dos Mestres maçons da Loja é eleito para, durante um ano, exercer o ofíci0 de Venerável Mestre. Outro dos Mestres maçons da Loja é eleito para, durante o mesmo período, exercer o ofício de Tesoureiro da Loja. O Venerável Mestre eleito designa, segundo os costumes e os critérios próprios da Loja, estabelecidos ao longo do tempo, os Mestres maçons que exercem os demais ofícios necessários para o bom funcionamento da Loja. Independentemente do grau que tenha ou deixe de ter cada um dos designados. Durante um ano, os Oficiais da Loja exercem os poderes e cumprem os deveres inerentes aos respetivos ofícios e os demais elementos da Loja respeitam esse exercício e, se assim o quiserem, colaboram. Em qualquer assunto que se debata, todos - mas rigorosamente todos! - os Mestres maçons, independentemente do grau que porventura adicionalmente detenham ou do ofício que no momento cada um exerça ou não, têm exatamente o mesmo direito à palavra e o mesmo direito ao voto, com exatamente o mesmo valor.

Igualdade absoluta, pois.

Também as Lojas são estritamente iguais. Nenhuma tem mais direitos ou deveres do que as outras.

Sendo assim, perguntará, e bem, quem está de fora, porque há 33 graus, que relação existe entre eles, se não é hierárquica, em que consiste esse paradigma de graus "iguais"?

Essa é matéria que procurarei esclarecer no próximo texto, dedicado aos Altos Graus.

Rui Bandeira

9 comentários:

jpa disse...

E assim o Mestre Rui Bandeira, deita por terra toda a teoria da conspiração relativa ao grau 33º.

Mas percebem porquê?
Ele é grau 32º, ainda não está na posse daqueles poderes! LOL

Cumprimentos
JPA

Candido disse...

Viva jpa:
Mas como é que é?!
abraço

Jocelino Neto disse...

Excelente prancha!

http://www.rlmad.net/rlmad-main/mmenu-pranchas/283-mac-objectiv.html

Candido disse...

Viva Rui:
Compus um texto, que deu erro durante a transmissão e como não pude recupera-lo, estou a fazer outro. Preço da ruralidade!

Dizia eu que gostei mt do seu texto e que me detive a pensar na quantidade de informação/ formação maçónica que se obtém neste site, que não é normal, exceptuando,claro está, os ditos brasileiros!
A esse proposito, lembrei-me duma passagem dum prefacio do Antonio Arnaut a um livro da miriam assor que gostaria de ver comentada por si, dado que o Rui tem o dom de explorar estes temas com simplicidade.
Para não a dizer de cor tive que procurar o dito. Diz Antonio Arnaut a certa altura:
"Nenhuma Historia da Maçonaria é rigorosamente verdadeira.Os historiadores maçons, compreensivelmente, não dizem tudo o que sabem e pecam por omissão; os outros dizem mais do que sabem e incorrem em deturpações, ou até,quando mal intencionados, em grosseiras falsidades" . O livro é: viagem aos segredos da maçonaria.
Um abraço a todos.

Candido disse...

Viva Jocelino:
Veio mesmo a proposito!
Obrigado.
Abraço

Rui Bandeira disse...

@ Jocelino Neto:

Também acho! O que não quer dizer que concorde com tudo o que nela se expões (e não concordo)... Mas em Maçonaria aprende-se, precisamente, entre outras coisas, a não enfatizar demasiado as divergências (que são naturais e, até, saudáveis) e a valorizar as convergências e a cooperar nesse âmbito!

As pranchas (muitas) que estão publicadas no sítio da nossa Loja mostram bem a quem quiser ver o que nela se faz: apresentação e discussão de trabalhos, sempre na perspetiva de contribuir para o aperfeiçoamento de todos e d cada um.

E, como se vê, não somos indulgentes connosco próprios:temos olho e voz crítica para nós e a nossa organização e procuramos melhorá-la e melhorar a nossa ação. Com uma diferença em relação às considerações, normalmente inconsistentes, vindas do exterior: nós sabemos do que falamos!

@ candido:

Tomei nota da sua sugestão e oportunamente procurarei comentar esse texto de António Arnaut.

Mas de algo tenho que o advertir: não será brevemente! O meu plano de textos (e, por razões evidentes de gestão de tempo, já há mais de um ano que tive de reduzir a minha frequência de publicação para um texto por semana) está já elaborado e preenchido para os tempos mais próximos...

Jocelino Neto disse...

Candido: Como disse, é um prazer contribuir.Espero, se me for permitido, continuar.

Mestre Rui: Concordo plenamente com o que comentas. Mas está aí um dos "segredos" da vida. Diante das inconsistências e certezas, desequilíbrios e firmezas, harmonizar-se.

Muitíssimo agradecido por seu comentário. Vês, Ouves, Falas, pois Vives.

Paulo Hudson disse...

Olá, desculpe a intromissão deste profano, mas ao estudar o texto, que mostra a igualdade entre os graus de mestre maçon e que não há ierarquia entre eles, pude perceber que deve haver alguma ierarquia sim, veja o exemplo no texto do Rui Bandeira diz que "aquele que tem "apenas" o 3.º grau pode ser eleito Venerável Mestre e dirigir os outros..." isso demonstra ierarquia, ou seja, não há ierarquia entre os graus maçons, mas há entre os ofícios exercidos pelo maçons, independente do grau. Será que estou certo?

Rui Bandeira disse...

@ Paulo Hudson:

Não diria propriamente hierarquia, mas inevitavelmente diferentes responsabilidades e competências, nuns ofícios mais exigentes do que noutros.

O ofício de Venerável Mestre é indubitavelmente o de maior responsabilidade e exigência numa Loja maçónica, pois ao seu titular é delegado o poder e o dever de dirigir os trabalhos da Loja, fixar a agenda das reuniões, representá-la externamente ou delegar essa reprrsentação, e executar as deliberações da Loja.

Para melhor entendimento do que é o ofício de Venerável Mestre sugiro a leitura do texto neste blogue dedicado a ese ofício, acessível em http://a-partir-pedra.blogspot.com/2006/09/lxico-manico-venervel-mestre.html .

Para melhor elucidação sobre os diferentes ofícios de uma Loja maçónica, sugiro que procure, na coluna da direita deste blogue, o marcador "Ofícios da Loja" e, acedendo a ele, consulte os dezasseis textos em que este tema é, direta ou indiretamente, referido (os textos aparecem por ordem de publicação, do mais recente para o mais antigo).