09 junho 2009

Solidariedade Pura


O texto que se segue não é da minha autoria, como aliás pelo estilo de escrita poderão facilmente perceber.
Encontrei-o no Blogue Hormonas Adolescentes e uma Tablete de Chocolate que é escrito por uma jovem de 16 ou 17 anos e do qual sou leitor assiduo desde o primeiro post. É um blog simples de uma pessoa que se procura a ela própria como é natural para quem tem a idade que "To Be or not To Be" tem, aliás o pseudónimo que escolheu é em si revelador.
Na verdade procuramos-nos todos a nós próprios todos os dias.
A mensagem que retirei deste texto, para além da "descoberta da solidariedade" por parte da autora, é que basta um quase nada para fazer uma pessoa feliz, ou se quisermos um pouco menos infeliz. Parafraseando uma amiga minha que por sua vez cita autor cujo nome me falha "Temos pelo menos a obrigação de tentar ser felizes".
A sua procura começa a dar resultados e o seu exemplo na simplicidade dos gestos relatados deverão ser de inspiração para os leitores, mesmo para os menos atentos.

Por tudo isto imediatamente solicitei autorização para publicar aqui este texto, autorização essa que me foi concedida

"
TEODORO




Banco Alimentar



No passado fim de semana fui como voluntária para o Banco Alimentar. Foi a primeira vez (o que é um bocado vergonhoso tendo em conta a minha já avançada idade) e até tive sorte pois fui parar ao supermercado Pingo Doce mesmo por detrás de minha casa (o que, diga-se de passagem, poupou uma grande parte do tempo que teria perdido em deslocações). Inscrevi-me para as tardes de sábado e domingo ficando a trabalhar em ambos os dias das 17h às 21h. Com um grande espírito positivo comecei o meu sábado. Conheci pessoas porreiras e estive em situações ligeiramente constrangedoras mas correu tudo às mil maravilhas.



Logo ao início, no meio de risos e muito divertimento, foi-me apresentada uma pessoa cuja cara não me era nada estranha. De dentes pretos, olhar seguro, alto, cabelo grisalho e comprido, uma grande barba e um ar muito sujo, foi-me apresentado o Teodoro (aparentemente um sem abrigo da minha zona). Olhou-me com um ar altivo e superior, deu-me completo desprezo e acho que nem sequer ouviu as minhas primeiras frases. Isto irritou-me logo profundamente e pensei cá com os meus botões: "Idiota do homem que é sem abrigo mas ainda se dá ao luxo de me olhar de lado!". Armei-me então em "amiga dos pobrezinhos", decidi fazer o sacrifício e dar ao Teodoro o privilégio de ser meu amigo.Ao longo do dia fui conhecendo pouco a pouco a vida desta personagem estranha que só bebia "leite de vacas ruivas" (vinho portanto). Descobri que é romeno, que há 16 anos que vive em Portugal cujos últimos 8 têm sido passados na rua e que espera ansiosamente pelo dia 31 de Fevereiro. Acabou por simpatizar comigo e acho que até me começava a achar alguma piada. O dia foi-se desenrolando...



Já para o final da tarde, depois de muitos sacos entregues mas também algumas caras que nem se deram ao trabalho de me responder, vejo um belo dum Tuareg entrar a 100km/h na zona e estacionar mesmo em cima da passadeira. De dentro do Tuareg, claro está, sai a boazona da tia com uns grandas saltos, unhas arranjadas, cabelo como se acabado de sair do cabeleireiro e mais "bling-blings" que o 50 cent. Pensei que agora sim iriamos ter uma boa contribuição... burra! Ao entrar chinelando nos seus sapatos Gucci, estendo-lhe o meu braço para lhe entregar um saco e com um sorriso pergunto-lhe: "Boa tarde, deseja contribuir para o Banco Alimentar?", ao que obtenho um sorriso de gozo e um "EU?! A menina deve estar "masé" a brincar!". Extremamente frustrada, desiludida e com vontade de lhe arrancar os "bling-blings" todos continuei a minha missão de entregar sacos...



O dia seguiu-se, sempre acompanhado pelo desconfiado do Teodoro para quem já começava a não ter pachorra nenhuma. Às tantas este levanta-se e olha para mim, estende-me a mão e diz:" Dá-me um saco", ao que eu respondi: "Sabe que não se podem usar sacos fora do supermercado não sabe?", ao que ele me respondeu: "Ora, eu vou entrar. Tenho ou não tenho direito a um saco?". Lá me vi obrigada a dar-lhe o maldito do saco de plástico. Para meu espanto, com os poucos trocos que recebeu, o Teodoro foi comprar um pacote de leite que pôs dentro de um saco e entregou ao Banco Alimentar. Nem podia crer... Ele era o único que teria alguma vez a justificação para ser egoísta e não partilhar! Crise?? Mais crise do que isto não há e mesmo assim há espaço para dar aos outros.



Antes de me ir embora (de lágrima no canto do olho) o Teodoro chama-me para o lado, entrega-me uma flor e diz-me: "Porque tu és a menina mais bonita que já alguma vez conheci.". A minha alma estava parva! Privilégio tinha eu de alguma vez na vida ter tido a sorte de me cruzar com uma pessoa como o Teodoro.


To Be Or Not To Be "


Tenham dois belissimos feriados, e pensem que um sorriso, uma palavra, um gesto, um qualquer coisa com sentimento em direcção a outrem pode ser a coisa mais importante de cada dia para quem dá e para quem recebe.


José Ruah


5 comentários:

To be or not to be disse...

Obrigadíssima pela publicação da minha história no blog. É óptimo saber que gostam do que escrevo!

Diogo disse...

Conheço também pessoas que vão distribuir refeições quentes aos sem-abrigo (e cada vez mais a gente da classe média). Penitencio-me por não ter ainda participado pessoalmente.

Mas a questão que coloco é: porque é que existem pessoas sem casa nem pão nos dias de hoje? Que mundo é este onde meia dúzia possui biliões e outros (cada vez mais) não têm nada? Não terá chegado a altura de dar uma grande volta a isto tudo?

To be or not to be disse...

Eu também já fiz voluntariado na Sopa dos Pobres (distribuindo comida pelas ruas de Lisboa). Acho que é uma experiência enriquecedora e que todos nós deveríamos fazer (para ver se nos sensibilizamos um bocadinho mais com os problemas dos que têm menos).
Concordo plenamente e acho que já se anda a "pensar em fazer alguma coisa" à tempo demais. No entanto não sou o senhor presidente ou (pelo menos ainda) uma voz suficientemente "alta" para poder mudar mundos, portanto contento-me com fazer os pequenos gestos que estão ao meu alcance e acredito que se, em vez de refilarmos com os outros, cada um de nós se concentrasse em fazer o bocadinho que está ao seu alcance os pobrezinhos não eram tao pobrezinhos assim, seguramente.

Jose Ruah disse...

@ TBONTB

Não precisa de agradecer. Neste espaço também há espaço para pessoas como TBONTB.

Concordo com o que diz, e acho que é uma grande verdade, que se em vez de usarmos a lingua afiada para dizer mal fizermos qualquer coisa o mundo pode de facto melhorar.

Continue a escrever que vou continuar a ler. Poderá acontecer que lhe vá pedir autorização novamente.

florbela silva disse...

Vulneráveis e veneráveis Srs,

A Solidareidade não se ensina, nasce connosco ou temos ou não temos.
Para isso temos séculos de passado para analizar e melhorarmos o que está mal e corrigir com os nossos actos no dia-a-dia .
Estou lisonjeada por ser acolhida por semelhantes humanos que sabem o que é sofrer pelos outros e partilhar da sua dor.
Ao longo de toda a minha vida tive momentos de loucura em que entreguei tudo por amor, e entreguei a minha honra a alguém que acreditava em grandes projectos e sofria de igual maneira como EU.
Aos 12 anos tive a visão de um cometa que me ensinou que olhares para o C.E.U resolvem os problemas da terra, com a prática do Bem mesmo com isso tenham que haver várias mortes.

É dos actos mais nobres podermos ajudar todos aqueles que têm ainda os cinco sentidos e que conseguem ter olhares através da sensibilidade dos dedos .
Neste momento, várias descrenças reinam no nosso reino, para isso temos que agir em uníssono e fazer regressar ás suas origens todos aqueles que derivam do Inferno .

Graças a Deus que pela primeira vez ACREDITO NA ACREDITAR.
Flor